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Zacarias 14.1-15 - A Poderosa Chegada do Grande Rei

O último capítulo de Zacarias atinge o clímax da esperança de Israel no campo da restauração futura, mas não sem informar que muitas dores ainda virão antes disso. O capítulo anterior termina prevendo o extermínio de mais da metade dos israelitas em seu território durante os dias de perseguição da Grande Tribulação. O capítulo final dá seguimento a partir desse ponto, caminhando para uma grande, emocionante e impactante virada na situação por meio da presença e da ação do redentor no meio do seu povo.

O profeta inicia o capítulo com um anúncio bastante doloroso para seus ouvintes (v.1): “Eis que vem o Dia do Senhor, no qual os teus pertences serão repartidos no meio de ti”. É notável a repetição insistente do “Dia do Senhor” e da expressão correspondente “naquele dia” ao longo do capítulo, sendo que ela aponta para o período no qual Deus trará juízos a Israel e às nações da Terra em um período de sete anos que antecederão a vinda do Messias para reinar. Sendo assim, é interessante observar a forma que Zacarias utiliza para expor tais eventos futuros. Ele relata aqui o resultado da ação que somente será descrita no versículo seguinte. Se esse método não é o mais claro possível, pelo menos é o mais delicado, pois expõe aos poucos os terríveis sofrimentos que Israel sofrerá naqueles dias, sendo que a primeira informação do profeta tem a ver com os espólios de guerra, ou seja, os “pertences” do povo. O texto informa que tais bens “serão repartidos no meio de ti”, o que quer dizer que a terra dos israelitas será dominada por estrangeiros e eles serão privados das suas propriedades, as quais serão divididas entre seus conquistadores.

A pergunta natural que o leitor faz a essa altura é “quem são esses invasores”, ao que o versículo seguinte explica (v.2a): “Pois eu reunirei todas as nações para guerrear contra Jerusalém”. Nem sempre é fácil compreender, em contextos assim, a expressão “todas as nações”. Uma liga militar que venha sobre o relativamente pequeno território da Palestina dificilmente contaria com a presença de exércitos de todos os cerca de duzentos países do planeta. Assim, a expressão “todas as nações” pode ser uma referência a uma liga das nações mais influentes em termos militares, ou todas as nações vizinhas de Israel que são historicamente inimigas do povo judeu. A primeira possibilidade é mais viável, sendo que, mesmo que não haja soldados de cada país do mundo, esse exército representaria a oposição mundial dos homens ao povo de Deus e ao nome do Senhor. O curioso é que essa oposição é potencializada em um exército por ação direta de Deus, o qual explica que “eu reunirei todas as nações” com a intenção de “guerrear contra Jerusalém”. A cidade de “Jerusalém” serve aqui como representação de toda a nação, a qual tem tal cidade como seu centro religioso, apesar de não tê-la, em nossos dias, como seu centro político.

Se a primeira parte do versículo é chocante, a segunda é estarrecedora (v.2b): “De modo que a cidade será tomada, as casas serão saqueadas e as mulheres serão violentadas”. Muitas vezes os exércitos inimigos se dirigiram a Jerusalém com a intenção de dominá-la, mas nem sempre obtiveram sucesso em seu intento, como na invasão de Senaqueribe, cujo desejo de destruir Jerusalém (2Rs 18) foi frustrado pela ação divina que ceifou em uma noite quase todo o seu exército (2Rs 19.35-37). Entretanto, Nabucodonosor, rei da Babilônia, não teve nenhuma dificuldade de tomar a cidade, destruir seus muros e queimar o templo (2Rs 25.1-7), assim como ocorreu no primeiro século da era cristã diante da invasão romana liderada por Tito (70 d.C.). A diferença entre a capacidade e a incapacidade dos exércitos inimigos de conquistar Jerusalém nunca dependeu do seu poderio militar, mas do desejo de Deus de proteger ou de punir seu povo (ex: 2Rs 24.20). Por isso, dizer que “a cidade será tomada” significa que o próprio Deus a entregou nas mãos dos inimigos. A menção ao saque das moradas dos judeus e ao estupro de suas mulheres também demonstra que a motivação dos invasores não será apenas estratégica, mas movida por ódio, crueldade e desprezo por Israel.

Se a história acabasse aqui, Israel veria seu fim definitivo. Porém, esse pano de fundo é pintado com a intenção de ressaltar a virada promovida por Deus (v.3): “Mas o Senhor sairá para guerrear contra as nações, do mesmo modo que ele guerreou no dia da batalha”. Se esse parecia ser o fim do povo israelita, a surpresa será ver o próprio Senhor se levantar contra os exércitos inimigos formados pela conflagração das nações do mundo. E, ao fazê-lo, ele agirá como em outras ocasiões que demonstraram seu grande poder e sua maravilhosa intervenção em benefício do seu povo, do mesmo modo que “ele guerreou no dia da batalha”. O texto não se refere a uma batalha específica. Entretanto, dadas as características da ocasião, é provável que os primeiros eventos que vieram à mente dos ouvintes de Zacarias foram as grandes libertações divinas no êxodo, especialmente a travessia em seco de Israel pelo mar Vermelho e o afogamento das tropas egípcias (Êx 14.15-31), na morte dos exércitos amonita, moabita e edomita nos dias de Josafá (2Cr 20) e na destruição do exército de Senaqueribe nos dias de Ezequias (2Rs 19.35-37) — batalhas nas quais Deus venceu os inimigos sem que Israel precisasse sequer empunhar suas espadas. Além dessas, há outras batalhas em que Deus mostrou seu maravilhoso poder, como na destruição dos cananitas em meio a uma chuva de pedras (Js 10.11), ou na perseguição dos amorreus enquanto o Sol permaneceu parado, sem se pôr, por quase um dia inteiro (Js 10.12-15). O fato é que os israelitas tinham sua história marcada por batalhas nas quais o Senhor lutou por eles. O que esse texto informa é que isso se repetirá mais uma vez naquele dia escatológico, em uma batalha culminante de Deus em favor do seu povo,[1] quando parecer ser o fim de Israel diante das nações invasoras.

A diferença marcante entre essas batalhas do passado e a guerra que ocorrerá naquele dia é que a presença divina será visível, de forma física (v.4a): “Naquele dia, seus pés estarão no monte das Oliveiras, que fica diante de Jerusalém, do lado Leste”. Essa menção deve ter intrigado os ouvintes do passado, mas não tanto os leitores dos dias do Novo Testamento, pois não é difícil identificar Jesus Cristo como o Deus cujos “pés estarão nos monte das Oliveiras”. Com isso, as palavras angélicas aos discípulos assumem uma nova colocação: “Varões galileus, por que estais olhando para as alturas? Esse Jesus que dentre vós foi assunto ao céu virá do modo como o vistes subir” (At 1.11). Ler esse texto à luz de Zacarias 14.4 nos faz compreender que Jesus não apenas voltará visivelmente, assim como partiu, como também voltará ao mesmo lugar de onde partiu (cf. At 1.12). A diferença é que, enquanto sua partida foi discreta e testemunhada apenas por seus amigos mais chegados, seu retorno será envolto por um evento geológico que chamará a atenção de todos ao redor e transformará a topografia da região (v.4b): “Então, o monte das Oliveiras será fendido ao meio, de Leste a Oeste, formando um grande vale. Metade do monte se afastará para o Norte e metade para o Sul”. Essa não será a primeira vez que a glória divina será manifesta nesse local (Ez 11.23), de modo que o acontecimento sísmico descrito aqui será apropriado para identificar aquele que pisará ali em seu retorno a fim de lutar contra os inimigos de Israel e libertar Jerusalém.

Esse terremoto será notável e criará pânico em Jerusalém, fazendo com que os habitantes e invasores corram para se salvar (v.5a): “Vós fugireis pelo vale dos meus montes, pois meus montes se estenderão até Azal. Assim, vós fugireis como fugistes de diante do terremoto dos dias de Uzias, rei de Judá”. Esse é um texto de difícil tradução e varia entre a ideia de o povo fugir do terremoto — conforme a tradução presente — e a ideia de a ruptura do solo impedir a locomoção no vale entre os montes, provavelmente o vale do Cedrom. Outra dificuldade é a perda da informação de onde ficava Azal — ou onde ficará. Mas a segunda frase do versículo clarifica a primeira, relatando a fuga da população em grande desespero, assim como os judeus fugiram “de diante do terremoto dos dias de Uzias, rei de Judá”. À primeira vista, essa informação também não ajuda muito, mas isso não é verdade. O fato de esse evento ser utilizado como datação dada por Amós para o seu livro (Am 1.1) — e de depois ser citado por Zacarias como comparação de um evento escatológico — mostra que o tremor de terra foi tão significativo que se tornou muito bem conhecido de várias gerações. Isso só ocorreria se tal tremor tivesse sido devastador e tivesse aterrorizado o povo, do mesmo modo que o terremoto escatológico que ocorrerá no retorno do Messias fará aos habitantes de Jerusalém, em meio a efeitos cataclísmicos e uma libertação inaudita.[2]

Em meio a tais acontecimentos surpreendentes e aterradores, o texto informa que o redentor divino virá (v.5b): “Então, o Senhor, o meu Deus, virá com todos os santos”. Há certa discussão sobre a tradução correta do que aqui foi grafado como “o meu Deus”, pois há textos que usam a terceira pessoa em vez da segunda. Mas a questão mais intrigante é mesmo a identidade de “todos os santos” que acompanharão o Senhor na sua vinda e, ao que tudo indica, na batalha que ele vencerá. Há quem identifique esses “santos” como seus assistentes celestiais de natureza angelical (Sl 89.5,7),[3] ao passo que há também quem entenda que esses acompanhantes do Senhor são o grupo formado por aqueles que morreram e que, por sua fé, foram recebidos nos céus e ressuscitados no encontro com Jesus, aos quais foi prometido que hão de reinar com Cristo (2Tm 2.12; Ap 5.10). Apesar de essa última esperança ser correta e verdadeira, nesse texto de Zacarias é muito improvável que a menção aos santos seja uma referência exclusiva aos crentes. O Novo Testamento também fala da ocasião utilizando o mesmo termo (1Ts 3.13), deixando, porém, a questão da identidade dos santos em aberto. A resposta acaba vindo do próprio Antigo Testamento, pois o termo “santos” é frequentemente utilizado como uma descrição angelical (Dt 33.2; Jó 5.1; Dn 4.13; 8.13). Na verdade, quando o evangelho de Mateus relata o mesmo evento, ele cita a vinda e a ação dos anjos naquele dia (Mt 24.30,31; 25.31), sendo esse o sentido provável e preferível do texto de Zacarias. Outra possibilidade que não anula o que foi dito até aqui é que tais santos sejam os crentes juntamente com os anjos.[4]

Não somente a terra apontará a chegada do Messias, mas também os céus e o clima (vv.6,7): “Naquele dia, não haverá luz, mas haverá frio e gelo. Naquele dia único, conhecido pelo Senhor, não haverá dia nem noite, mas haverá a luz do entardecer”. O significado desse trecho também levanta dúvidas, mas, ao que tudo indica, trata-se da descrição de uma luz desvanecente típica do “crepúsculo”, o que também é chamado de “lusco-fusco”.[5] Tal condição se estenderá além do tempo normal, impedindo que o dia anoiteça e que seja sucedido por outro. Há quem diga que tal condição durará até o fim da história, mas os relatos paralelos que falam sobre o reinado subsequente a esse julgamento e destruição militar que ocorrerão na chegada do Messias não condizem com essa ideia, sendo mais provável que a condição de luz e clima dure até o final do juízo referido. Isso é realmente mais provável, pois tal evento, acompanhado de outros acontecimentos paralelos, como o escurecimento do Sol e da Lua, além da queda de estrelas, são previsões ligadas apenas ao dia da poderosa vinda do Senhor a fim de punir as nações (Is 13.10; 34.4; Jl 2.10,30,31; 3.15; Mt 24.29).

Juntamente com os acontecimentos geológicos e climáticos desse dia, um evento hídrico será notável (v.8): “Naquele dia, sairão águas vivas de Jerusalém, metade delas para o mar oriental e a outra metade para o mar ocidental. Isso acontecerá no verão e no inverno”. Esse texto enfrenta sua primeira dificuldade de interpretação por causa de textos do Novo Testamento que nada têm a ver com essa predição, mas com a ação espiritual nos salvos, como, por exemplo, o trecho no qual Jesus diz que “quem crer em mim, como diz a Escritura, do seu interior fluirão rios de água viva” (Jo 7.38). A dificuldade é que, depois de ler sobre tal “água viva”, fica quase impossível não associá-la em alguma medida à menção feita por Zacarias. Contudo, quando ele diz que “águas vivas” correrão a partir de Jerusalém, parece ter em mente apenas uma corrente de água que se move na forma de um rio. A qualificação dessas águas como sendo “vivas” tem, provavelmente, relação tanto com a sua quantidade como com sua finalidade, ou seja, águas abundantes que irrigarão grandes porções de terra, tanto a leste de Jerusalém, em direção ao Jordão e ao mar Morto, quanto a oeste, desaguando no mar Mediterrâneo. O fato de essa abundância de água correr tanto no “verão” como no “inverno” indica o tipo de provisão, de fertilidade e de prosperidade que o Senhor dará a Israel no futuro, em cumprimento de promessas feitas no passado.

Entretanto, a promessa mais esperada por Israel desde muito tempo atrás não está ligada à produção agropecuária, mas ao seu governo, um governo real há muito prometido. A libertação militar de Israel pelo Messias coincide com a inauguração do seu reinado (v.9): “Então, o Senhor será rei sobre toda a terra. Naquele dia, haverá um só Senhor e seu nome será um somente”. Assim, o Messias assumirá seu lugar de direito, sendo Deus e rei ao mesmo tempo, conforme a previsão angelical que disse que “este será grande e será chamado Filho do Altíssimo; Deus, o Senhor, lhe dará o trono de Davi, seu pai; ele reinará para sempre sobre a casa de Jacó, e o seu reinado não terá fim” (Lc 1.32,33). Esse reino, o mesmo sobre o qual Davi reinou, é especificamente Israel. Entretanto, as Escrituras ensinam que o governo do Messias se espalhará pelo mundo todo. Os profetas Isaías e Miqueias, por exemplo, explicam que isso acontecerá quando pessoas de todas as nações vierem ao rei divino, em Jerusalém, para adorá-lo e aprender com ele (Is 2.2-4; Mq 4.1-3). Desse modo, o rei divino comandará o mundo todo.

A vinda do Messias trará à cena mais um evento geológico, dessa vez por todo o entorno de Jerusalém, ao longo de todo o território da tribo de Judá (v.10a): “Toda a terra entre Geba e Rimom,  ao sul de Jerusalém, se tornará como a Arabá”. A palavra “Arabá” pode ser traduzida como “planície” ou “estepe”, de modo que o texto poderia também dizer que “toda a terra entre Geba e Rimom, ao sul de Jerusalém, se tornará uma planície”. Arabá também é a designação dada ao vale que se estende do mar da Galileia, passando pelo vale do Jordão e pelo mar Morto, terminando no golfo de Aqaba, uma terra plana que dá sentido à comparação feita pelo texto. Quanto à descrição “entre Geba e Rimom” — ou “de Geba a Rimom” —, trata-se de uma referência a toda a extensão de Judá, de Norte (Js 21.17; 2Rs 23.8) a Sul (Js 15.32; 19.7).[6] Isso quer dizer que toda aquela região montanhosa será aplanada, deixando Jerusalém, que atualmente fica escondida entre diversos montes, exposta e visível a grande distância (v.10b): “Ela será elevada e estabelecida no seu lugar próprio, desde a porta de Benjamim até o local da porta antiga, até a porta da Esquina, e desde a torre de Hananel até os lagares do rei”. A nova topografia será condizente com a proeminência religiosa e governamental de Jerusalém em relação ao mundo (Is 2.2),[7] pois ela será o ponto mais alto de toda aquela região, ficando em grande destaque. Todos os seus lados, indicados pelos nomes desses portões e lugares específicos, alguns conhecidos e outros não, serão visíveis e acessíveis para todos aqueles que virão ao centro do governo do reino messiânico.

Com isso, Jerusalém se tornará mais uma vez a sede de um trono, com a diferença de que, dessa vez, sua existência e influência jamais serão ameaçadas (v.11): “Eles habitarão nela e não haverá mais destruição, mas Jerusalém habitará em segurança”. Esse estabelecimento seguro é característico do líder que governará nessa cidade. Entretanto, o profeta quer dizer mais do que isso. Ao utilizar a palavra hebraica herem, traduzida como “destruição”, o escritor lança mão de um conceito teológico de ofertas a Deus que lhes eram consagradas (Lv 27.28),[8] as quais eram destinadas ao seu serviço ou à destruição, como ocorreu à cidade de Jericó durante a invasão israelita de Canaã, da qual não podiam ser tomados despojos para as pessoas (Js 6.19). O mesmo ocorreu aos povos cananitas, os quais deviam ser completamente aniquilados (Nm 21.2,3; Js 6:21; 8:26; 10:28; 11:11). Assim, o profeta quer dizer que Jerusalém nunca mais será destruída como um tipo de sacrifício ou em alguma forma de punição, pois Deus a protegerá e a tornará segura.[9] Dizer também que os seus moradores “habitarão nela” transmite a ideia de uma grande população que nunca mais será exilada ou reduzida.

Contudo, a intenção de Zacarias, ao utilizar a palavra hebraica herem em relação à Jerusalém, não esgota seu significado no v.11, mas serve para contrastar a segurança de Jerusalém com a completa destruição dos exércitos inimigos que combaterem contra ela (vv.12-15). Assim, ainda que cite daqui para frente eventos que, cronologicamente, são anteriores à paz de Jerusalém e ao reinado soberano do Messias, descritos nos vv.8-11, o profeta volta à narrativa da destruição dos exércitos (vv.1,2) que vinham subjugando aquela cidade e seu povo (v.12): “Esta é a praga com a qual o Senhor ferirá todos os povos que guerrearem contra Jerusalém: o apodrecimento da sua carne enquanto estão de pé, o apodrecimento dos seus olhos em suas órbitas e o apodrecimento das suas línguas em suas bocas”. A linguagem utilizada daqui por diante tem a intenção de ser forte, dando o tom da violência com que os inimigos serão abatidos nessa batalha. Entretanto, como é típico da literatura apocalíptica, o texto acaba por fornecer poucos detalhes para sua interpretação factual. O que é possível depreender desse texto é que uma parte dos combatentes opositores sofrerá algo terrível que afetará seus corpos a ponto de corrompê-los e destruí-los de modo rápido e irresistível, seja na forma de algum tipo de doença ou praga ou até de um ataque externo.

Junto com aquela destruição arrebatadora, Deus confundirá seus inimigos de modo que eles mesmos se infligirão ruína (v.13): “Naquele dia, haverá uma grande confusão produzida pelo Senhor entre eles, de modo que cada um agarrará a mão do seu companheiro e levantará sua própria mão contra ele”. Tal confusão, já pincelada em Zacarias 12.4, traz à mente dos leitores o episódio do ataque de Gideão e seus trezentos soldados ao acampamento midianita. Nessa ocasião, os 120 mil soldados midianitas foram tomados de pânico e confusão, não apenas pela estratégia de Gideão, mas também pela intervenção de Deus, a ponto de matarem uns aos outros: “Ao soar das trezentas trombetas, o Senhor tornou a espada de um contra o outro, e isto em todo o arraial, que fugiu rumo de Zererá, até Bete-Sita, até ao limite de Abel-Meolá, acima de Tabate” (Jz 7.22).

Entretanto, os israelitas não ficarão de fora da batalha (v.14a): “Judá também lutará em Jerusalém”. Com isso, o profeta confirma a virada militar que anunciou antes (Zc 10.4,5; 12.5-7), prevendo também que a espoliação que Israel sofreu anteriormente passará por uma reversão (v.14b): “As riquezas de todas as nações vizinhas serão recolhidas: ouro, prata e roupas em grande quantidade”. Isso quer dizer que Israel, agora vitorioso por causa da intervenção e libertação de Deus, irá recolher o espólio de seus inimigos derrotados, o que inclui aquilo que foi originalmente tirado deles no v.1, demonstrando que a situação descrita no início do capítulo foi permanentemente invertida.[10] O profeta Ezequiel parece anunciar o mesmo, ao dizer: “Não trarão lenha do campo, nem a cortarão dos bosques, mas com as armas acenderão fogo; saquearão aos que os saquearam e despojarão aos que os despojaram, diz o Senhor Deus” (Ez 39.10).

O profeta termina com um anúncio a respeito dos animais que estiverem nos acampamentos inimigos (v.15): “A praga fará o mesmo aos cavalos, às mulas, aos camelos, aos jumentos e a todos os animais que estiverem naqueles acampamentos”. Nesse ponto é difícil saber como essa descrição condiz com a realidade futura, pois não sabemos a quantidade de animais — ou se haverá animais — entre exércitos com armamentos e equipamentos típicos da nossa era. Contudo, o profeta parece mais interessado em se fazer compreensível para seus leitores do passado que fornecer informações tecnológicas aos leitores atuais, tendo como objetivo central expressar, de modo ilustrativo,[11] a destruição completa dos inimigos do Senhor e do seu povo.

É empolgante saber como ocorrerá a vitória final de Jesus como Deus e rei. Entretanto, apesar do interesse profético de Zacarias em informar judeus e gentios crentes sobre tal futuro, seu interesse pastoral foi encorajar os israelitas que estavam trabalhando na reconstrução do templo, em Jerusalém, e exortá-los à santificação de suas vidas de modo a priorizar a glória divina aos seus próprios impulsos e desejos pessoais. A verdade é que a certeza da vitória futura e o deleite de saber como ela ocorrerá têm um efeito espiritual encorajador, restaurador e santificador sobre aqueles que serão beneficiados por aquilo que Deus tem preparado para seus servos. Que esse efeito encha nossas vidas dia a dia assim como fez com os israelitas do passado!

Pr. Thomas Tronco


[1] Zuck, Roy. Teologia do Antigo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD, 2009, p. 457.

[2] Pinto, Carlos Osvaldo Cardoso. Foco e Desenvolvimento no Antigo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2006, p. 793.

[3] Baldwin, J. G. Ageu, Zacarias e Malaquias: Introdução e Comentário. Série Cultura Bíblica. São Paulo: Vida Nova, 2006, p. 170.

[4] Keil, C. F.; Delitzsch, F. Commentary on the Old Testament (electronic ed.), vol. 10. Peabody, MA: Hendrickson, 2002, p. 620.

[5] Schökel, Luiz Alonso. Dicionário Bíblico Hebraico-Português. São Paulo: Paulus, 1997, p. 515.

[6] The NET Bible. First Edition. Biblical Studies Press: www.bible.org, 2006 [Zc 14.10, nota 17].

[7] Walvoord, J. F.; Zuck, R. B. The Bible Knowledge Commentary: Old Testament. Colorado Springs: David C. Cook, 1983, p. 1571.

[8] Harris, R. L.; Archer Jr., G. L.; Waltke, B. K. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2005, p. 533-534.

[9] Merrill, Eugene. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Shedd Publicações, 2009, p. 537.

[10] Clark, D. J.; Hatton, H. A Handbook on Zechariah. UBS Handbook Series. Nova York: United Bible Societies, 2002, p. 361-362.

[11] Spence-Jones, H. D. M. (ed.). Zechariah. The Pulpit Commentary. London; New York: Funk & Wagnalls, 1909, p. 159.

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