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Zacarias 12.1-9 - O Fortalecimento dos Judeus e a Recuperação de Jerusalém

 

Os capítulos12 a 14 de Zacarias olham para o final da era em que vivemos, mais especificamente para o período da Tribulação, também chamado de “o dia do Senhor”. Na verdade, a expressão “naquele dia” aparece dezesseis vezes nesse três capítulos,[1] seis vezes apenas nesse trecho (Zc 12.3,4,6,8,9 — a expressão aparece duas vezes no v.8). Assim, a exposição da mensagem de julgamento mundial que foi dada pela primeira vez por Obadias (Ob 15-21)[2] é agora redesenhada com contornos novos e mais nítidos aos judeus do período pós-exílico. E isso veio em boa hora, pois dois anos após o reinício das obras do templo e diante de uma situação política desfavorável, servindo outra nação, sem um rei soberano e sem uma capital fortificada, o povo de Jerusalém devia estar cansado e desanimado. A mensagem de esperança na glória futura que é dada nesses capítulos é suficiente para ajudá-los nos próximos anos de trabalho duro e nos próximos séculos, para aqueles que ainda põem em Deus sua esperança de ver a nação arrependida e restaurada, política e espiritualmente, e o Messias prometido assentado no trono de Davi, reinando em meio à grandiosidade e santidade inauditas.[3]

Em vista da natureza da revelação futura em questão, tratando de uma restauração que podia parecer improvável e impossível aos olhos daquela geração e das seguintes, o Senhor apresenta sua identidade, seu poder e sua obra grandiosa como garantia de cumprimento e como sustentáculo da crença e da esperança que os judeus deviam ter (v.1): “Um oráculo dito pelo Senhor a respeito de Israel: ‘Declaração do Senhor, o qual estendeu os céus, estabeleceu a Terra e formou o espírito do homem no seu interior’”. Apesar de algumas versões optarem por dizer se tratar de um oráculo “contra Israel”, todo o contexto demonstra o oposto, ou seja, um oráculo a favor do povo judeu, de modo que a tradução “a respeito de Israel” é tanto preferível como a opção eleita pela maioria das versões.

A identidade do fiador de tais palavras é clara ao se declarar ser “um oráculo dito pelo Senhor”. O Deus de Israel era o próprio pronunciador do oráculo e aquele que se comprometeu com o cumprimento. Se o problema não era a origem da promessa, talvez fossem, na mente dos cansados e desencorajados israelitas, os inúmeros impedimentos políticos, econômico e sociais que podiam servir de empecilho para uma fé esperançosa daqueles homens. Para tanto, Deus lhes lembra de seu poder criador dos “céus” e da “Terra”. A criação e o êxodo sempre foram os fatores marcantes no sentido de informar os israelitas do poder ilimitado e soberano de Deus. Não é sem razão que a criação é oferecida aqui como pilar da fé. Além do mais, expor esse acontecimento de modo tão cênico, como desenrolar os céus como se fosse um mero tapete e estabelecer a Terra como se fosse o preparativo básico para a edificação de uma casa, deixa claro que mesmo as maiores obras são atividades que Deus executa sem ter dificuldades ou contratempos. Por fim, ao dizer que “formou o espírito do homem em seu interior”, o Senhor não apenas confirma seu poder, como seu interesse pelo que ocorre na vida dos homens e na história humana, de modo que não ficaria alheio àquele povo, nem ao seu futuro, e muito menos às promessas que lhe fez.

Feita a devida introdução, o Senhor anuncia seu oráculo (v.2): “Eis que estou para colocar Jerusalém como um cálice de embriaguês para todos os povos ao redor. Também Judá o será durante o cerco de Jerusalém”. O contexto em questão surge no final do versículo. Trata-se do anúncio de um cerco futuro à cidade de Jerusalém. Não é anunciado exatamente quem serão os invasores, mas, a julgar pela expressão “todos os povos ao redor”, parece se tratar de uma conflagração multinacional reunida com o fim de abater Israel. Assim, a história começa de forma dolorosa para Jerusalém, pois exércitos inimigos conseguem invadir e humilhar a cidade.[4] Porém, esse não é o final do evento, pois há também o anúncio de que, em resposta a essa invasão, “Jerusalém como um cálice de embriaguês” para seus invasores. A metáfora parece apontar para o efeito debilitante da bebida, de modo que esses exércitos inimigos serão abatidos como se estivessem embriagados e, assim, cairão diante dos judeus. Esse é o início do anúncio da restauração divina no trecho final de Zacarias.

O mesmo é dito utilizando outra metáfora (v.3): “Naquele dia, farei de Jerusalém uma pedra pesadíssima para todos os povos. Todos aqueles que a carregarem acabarão seriamente feridos e se juntarão a eles todos os povos da Terra”. A figura de linguagem usada dessa vez não compara Jerusalém — que não é a cidade em si, mas seu povo — não mais a uma bebida forte, mas a uma pesada rocha. Dessa vez, os inimigos caem sob o peso do povo a quem tentaram sobrecarregar com seu domínio. É a típica situação para a qual se encaixa muito bem o dito popular “o tiro saiu pela culatra”. A ideia exposta nos termos “acabarão seriamente feridos” significa que a guerra terá uma virada diametral e os invasores serão completamente abatidos — o que já havia ficado claro no versículo anterior. O que não havia sido exposto ainda é a extensão do abatimento a “todos os povos da Terra”.

Nem toda vez que a palavra “terra” surge tem como significado o planeta. Muitas vezes, terra é uma referência às terras ao redor de Israel, ou seja, à região que conhecemos como Oriente Médio. Contudo, nesse caso, a referência parece apontar para uma abrangência mundial,[5] razão pela qual a palavra Terra foi traduzida com letra maiúscula. A razão para esse pensamento é que a região ao redor de Israel já foi citada no v.2 e na primeira metade do v.3. O final desse texto vai além do Oriente Médio e estende seus olhos para povos de toda parte. Com isso, o abatimento de ordem mundial torna possível identificar a ocasião com a batalha descrita no livro de Apocalipse em um lugar chamado “Armagedom”, cujo resultado final é igual ao que Zacarias anuncia nesse trecho. Apesar de Armagedom ser a forma grega para o que em hebraico significa Monte Megido — que está mais perto da Galileia que de Jerusalém —, sabemos que outros focos de resistência judaica serão Jerusalém e Petra, antiga Bozra, locais onde também haverá livramento da parte de Deus (Is 63.1-6; Zc 14.3-9).

O desbaratamento dos exércitos inimigos não se deverá apenas à capacitação especial que o Senhor dará ao exército israelita e à sua própria participação pessoal, mas também a outra ação, dessa vez sobre os inimigos (v.4): “Naquele dia — declara o Senhor —, atingirei todo cavalo com insanidade e seu cavaleiro com loucura. Abrirei meus olhos sobre a casa de Judá e atingirei com cegueira os cavalos dos povos”. Assim como o profundo terror colocado no coração dos 120 mil midianitas atacados por trezentos soldados de Gideão, de modo a se matarem entre si em meio ao pânico (Jz 7.22), os invasores de Jerusalém serão tomados de confusão (Zc 14.13). A loucura e a cegueira dos cavalos e dos cavaleiros é um modo de retratar o caos em que os inimigos ficarão quando o Senhor iniciar seu poderoso livramento. A razão será o fato de Deus se importar com Israel, ideia descrita na ideia de abrir seus olhos sobre o povo. Nesse momento, o Senhor se presta a cumprir as promessas feitas aos antigos e a se compadecer do povo que viveu em trevas e distante de todo tipo de bênçãos que seus antepassados tiveram e desprezaram.

Dada a sentença contra os inimigos de Israel, o profeta revela um dos meios que Deus usará para destruir os invasores (v.5): “Os chefes de Judá dirão em seus corações: ‘Os moradores de Jerusalém são fortes no Senhor dos exércitos, seu Deus’”. Curiosamente, Judá e Jerusalém não serão apenas os objetos da libertação divina, mas as próprias armas do Senhor para executar o livramento.[6] O profeta Miqueias já havia associado a vinda do rei eterno, o Messias (Mq 5.2), à capacitação e utilização dos judeus como instrumentos de guerra do Senhor sobre as nações vizinhas (Mq 5.5,6 — Miqueias utiliza a figura da Assíria como um arquétipo dos inimigos de Israel e do Senhor) e sobre países do mundo todo (Mq 5.7-9). Zacarias faz o mesmo ao dizer que os judeus de Jerusalém serão “fortes no Senhor dos exércitos”. Na verdade, todo o povo judeu, não apenas os moradores de Jerusalém, será instrumento da guerra de Deus contra os pecadores rebeldes (v.6a): “Naquele dia, porei os chefes de Judá como um fogareiro entre gravetos e como uma tocha entre a palha e eles consumirão, à direita e à esquerda, todos os povos ao redor”. Se o caos e a desordem tomarão conta dos exércitos invasores, a extrema organização e competência dadas por Deus serão o diferencial dos judeus, razão pela qual seus líderes são citados aqui como fonte de destruição das nações vizinhas do mesmo modo que o fogo consome lenha seca.

Os resultados são uma libertação definitiva e a habitação permanente do povo de Israel em seu território e na sua capital (v.6b): “Então, Jerusalém será habitada outra vez naquele lugar: em Jerusalém”. Se na atual conjuntura, a impossibilidade de os israelitas dominarem Jerusalém os fez assentar a sede do seu governo em outra cidade — Tel Aviv —, o futuro virá com o governo reassentado na antiga capital sobre a qual foram feitas tantas promessas. Porém, há uma ordem cronológica na libertação (v.7): “Assim, o Senhor salvará primeiro as tendas de Judá para que não cresça a glória da casa de Davi e dos moradores de Jerusalém acima de Judá”. O profeta prevê primeiro o sucesso da guerra nas regiões periféricas — talvez uma menção a batalhas nas regiões do Armagedom e de Petra — para finalmente debelar os invasores de Jerusalém. A intenção parece ser a manutenção de uma unidade nacional verdadeira,[7] não apenas política, mas instalada no coração de todos, sem que haja quem se sinta melhor ou mais importante que outros, ou que uma região ou cidade queiram pleitear mais direitos que as demais.

A superioridade numérica dos invasores parece ser um ponto claro na profecia, dado o poder divino infundido nos habitantes de Jerusalém para não sucumbirem à invasão (v.8): “Naquele dia, o Senhor protegerá os moradores de Jerusalém para que não haja tropeço entre eles. Naquele dia, o mais vacilante dentre eles será como Davi e a casa de Davi será como Deus, como o anjo do Senhor diante deles”. Se a vitória parecia certa aos inimigos, sua surpresa será notar que o exército defensor, formado de judeus de todas as classes — provável razão pela qual surge a expressão “o mais vacilante dentre eles” —, apresenta uma capacidade militar superior à do exército mais numeroso, assim como o pequeno Davi venceu o gigante filisteu.[8] A declaração de que a dinastia de Davi será como Deus é uma hipérbole para mostrar o apromimoramento notável ​​que acompanhará essa batalha e, em consequência, a inauguração da era milenar.[9] É certo que os judeus terão uma participação militar primordial nessa ocasião, mas o parágrafo termina com a afirmação de que é o Senhor o causador da derrota dos invasores (v.9): “Naquele dia, eu me disporei a destruir todas as nações que vierem contra Jerusalém”. A soberania e a fidelidade de Deus às suas alianças são atributos que gritam no meio desse texto. Os combatentes e beneficiários da vitória dessa batalha será o povo israelita restaurado conforme as promessas, mas o responsável e o dono da vitória é o próprio Senhor.

Além de constituir um grande encorajamento e fonte de esperança para os servos de Deus, esse texto provê o severo alerta aos inimigos do Senhor e do seu povo. A mensagem do alerta é que há possibilidade de vitória para quem se levanta em rebeldia contra Deus, ainda que todas as circunstâncias pareçam apontar a derrota divina e do seu povo. Quando Deus abre seus olhos sobre seu povo para defendê-lo, cegueira e destruição caem sobre seus inimigos! Assim, é melhor mudar de lado enquanto é tempo. Crer em Cristo é o único fator que afasta a ira de Deus contra os pecadores e os torna seus filhos amados (Jo 3.36).

Pr. Thomas Tronco


[1] Baldwin, J. G. Ageu, Zacarias e Malaquias: Introdução e Comentário. Série Cultura Bíblica. São Paulo: Vida Nova, 2006, p. 157.

[2] Para uma lista dos teólogos que defendem que Obadias foi o primeiro dos profetas escritores, consultar Santos, Thomas T., Fundamentos da Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Mundo Cristão, 2014, p. 86.

[3] Pinto, Carlos Osvaldo Cardoso. Foco e Desenvolvimento no Antigo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2006, p. 789.

[4] Zuck, Roy. Teologia do Antigo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD, 2009, p. 461.

[5] Clark, D. J.; Hatton, H. A Handbook on Zechariah. UBS Handbook Series. Nova York: United Bible Societies, 2002, p. 312-313.

[6] Merrill, Eugene. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Shedd Publicações, 2009, p. 537.

[7] Walvoord, J. F.; Zuck, R. B. The Bible Knowledge Commentary: Old Testament. Colorado Springs: David C. Cook, 1983, p. 1567.

[8] Spence-Jones, H. D. M. (ed.) Zechariah. The Pulpit Commentary. London; New York: Funk & Wagnalls, 1909, p. 135.

[9] The NET Bible. First Edition. Biblical Studies Press: www.bible.org, 2006 [Zc 12.8, nota 12].

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