Sexta, 29 de Março de 2024
   
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Salmo 40 - Atividades que Marcam a Verdadeira Religião

 

Desde pequeno, me acostumei a notar, em diversas casas, alguns artefatos que revelavam certa religiosidade – ou superstição – de pessoas conhecidas da minha família. Budas, elefantes virados com a tromba para a parede, pequenas estátuas pousadas sobre notas de dólar, velas dispostas em pequenos altares nos cantos dos cômodos, cristais coloridos sobre as mesas, livros de meditação, cartas de adivinhação, quadros com temas religiosos, vasinhos com arruda e uma série de outros objetos dos quais nem consigo me lembrar.

Apesar dessa variedade, um item me parecia ser unanimidade entre os possuidores de tais hábitos: uma Bíblia aberta. Embora poucas dessas pessoas tenham o hábito de ler a Bíblia, a maioria supõe que a presença dela, com as páginas à vista, transmite uma espécie de “energia positiva” ou de “bons fluidos”, protegendo a casa de forças negativas. E mesmo com o desconhecimento grotesco do uso das Escrituras, tais pessoas sabem onde estão alguns textos que falam de proteção divina. Nesse sentido, o Salmo 40 – quase tanto quanto o 91 – é um dos textos mais utilizados para, segundo essa visão supersticiosa, proteger a casa e abençoar seus moradores.

O que tais pessoas ignoram é que a proteção presente nesse texto é a que o Senhor – e não uma página de livro – aplicou ao seu servo Davi. Trata-se de uma oração por livramento que apresenta, no seu corpo, diversas atividades que marcam a verdadeira adoração ao Senhor. Longe daquela religiosidade popular e intuitiva, esse salmo apresenta cinco atividades presentes na verdadeira religião, ou seja, no relacionamento entre o homem salvo e seu Deus salvador.

A primeira atividade que marca a verdadeira adoração é recordar com gratidão das bênçãos divinas. Diz-se que “brasileiro tem memória curta”. Mas quando o assunto é o relacionamento com o Senhor, pessoas de todas as nações, igualmente, tendem a olhar para o presente e se esquecer do que Deus fez no passado. O salmista tinha o passado vívido em sua mente. Ele diz (v.1): “Confiei plenamente no Senhor e ele se inclinou para mim” (qawwoh qiwwîtî yehwâ wayyet ’elay). Nem mesmo as preocupações que invadiam o coração do salmista o faziam esquecer as coisas que Deus lhe fez no passado, nem as respostas de oração que ele testemunhou. Esse “inclinar” de Deus, aproximando-se do servo, era algo vivo na memória de Davi lembrando-o de que Deus tinha e mantinha com ele um relacionamento amoroso e interessado. O resultado é a inevitável gratidão do salmista expressa no v.3: “Ele pôs na minha boca um cântico novo, louvor ao nosso Deus” (wayyitten bepî shîr hadash tehillâ le’lohênû). A gratidão vinda das recordações dos atos divinos explodia no salmista em forma de louvores e cânticos.

A segunda atividade é priorizar a confiança no Senhor. Sempre que algo complicado recai sobre alguém, é necessário buscar ajuda. Há duas opções: recorrer a Deus ou recorrer aos homens. Nesse aspecto, o v.4 traz uma importante lição para o verdadeiro servo de Deus: “Feliz é o homem que põe no Senhor a sua confiança e não se volta para os presunçosos, nem para os mentirosos” (’asrê hageber ’asher-sam yehwâ mivtahô welo’-panâ ’el-rehavîm wesatê kazav). Apesar da nítida vantagem de buscar a Deus nas dificuldades, a incredulidade humana faz com que o homem tenda a procurar ajuda em braços que ele pode ver com seus olhos. Um exemplo disso foi o rei Acaz, descendente de Deus e rei de Judá. Ao saber de uma coligação entre o reino do Norte e a Síria, entrou em pânico (Is 7.2) e resolveu comprar a ajuda do rei da Assíria (2Rs 16.7-9) em lugar de confiar na promessa de Deus de livramento (Is 7.3-7). O resultado foi que, quando o rei de Judá se viu novamente em apuros e lançou mão do mesmo expediente, o arrogante rei da Assíria também se mostrou mentiroso e, em vez de ajudá-lo, o oprimiu como faz um inimigo e não um aliado (2Cr 28.20,21). O verdadeiro servo de Deus faz o oposto do que fez Acaz. Entre a opção de confiar em Deus e a opção de confiar nos homens fortes, ele prioriza a confiança no seu Deus libertador.

A terceira é desenvolver uma atitude de obediência. Davi faz uma curiosa afirmação sobre Deus (v.6): “Não desejaste sacrifício, nem oferta [...] não pediste holocausto, nem oferta pelo pecado” (zevah ûminhâ lo’-hapatsta [...] ‘ôlâ wahata’â lo’ sha’alta). Tal afirmação é curiosa porque Deus, de fato, ordenou tais sacrifícios e ofertas, de modo que o texto parece contraditório. Entretanto, conclui-se, Davi recordou das palavras de Samuel a Saul, às quais, sem abolir os sacrifícios e ofertas, mostraram que Deus não preferia os sacrifícios à obediência devida a ele: “Porém, Samuel disse: tem, porventura, o Senhor tanto prazer em holocaustos e sacrifícios quanto em que se obedeça à sua palavra? Eis que o obedecer é melhor do que o sacrificar, e o atender, melhor do que a gordura de carneiros” (1Sm 15.22). Tentar convencer o Senhor com atitudes de religiosidade externa em meio à desobediência, não consegue comover seu coração, nem torná-lo devedor ao homem. O que Deus quer, em lugar de atos religiosos, é que seus servos o obedeçam como um filho obedece e honra ao pai.

A quarta atividade é louvar a Deus publicamente. Ainda que Davi estivesse angustiado, o louvor a Deus não perdia seu lugar porque, na verdade, não estava subordinado às condições em que se encontrava o salmista, mas à eterna glória do Senhor. Por isso, escreve (v.9): “Anunciarei as boas-novas de justiça na numerosa congregação. Eu não fecharei os meus lábios” (bissartî tsedeq beqahal rav hinneh sefatay lo’ ’ekla’ yehwâ). Essa é a expressão de um testemunho público a todas as pessoas ao redor. O salmista não deseja guardar para si os santos ensinos sobre a justiça do soberano. Nem tampouco se envergonha de se submeter à direção e correção do Senhor. Seu desejo é expor tais fatos diante da multidão a fim de proclamar a justiça, não própria, mas daquele que é justo sobre todos. Por intermédio do louvor público, Davi quer, também, encorajar outros servos de Deus a fazer o mesmo, pelo que os conclama (v.16): “Digam continuamente aqueles que amam a tua salvação: engrandecido seja o Senhor” (yo’merû tamîd yigdal yehwâ ’ohavê teshû‘ateka).

A última atividade da religião verdadeira é apresentar a Deus uma oração humilde. Nesse salmo, Davi faz vários pedidos a Deus, especialmente concentrados entre os vv.11-15: “Senhor, não retenhas de mim a tua compaixão” (’attâ yehwâ lo’-tikla’ rahameyka mimmennî); “seja favorável a me livrar, Senhor” (retseh yehwâ lehatsîlenî); “sejam envergonhados e derrotados juntamente aqueles que buscam tirar minha vida” (yebôshû weyahperû yahad mebaqshê nafshî lispôtah). Entretanto, ao expor seus pedidos, expõe a Deus, também, suas fraquezas (v.12): “Pois as minhas maldades se acercaram de mim” (kî ’affô-‘alay ra‘ôt). Ao apresentar a Deus sua pecaminosidade e imperfeição, Davi abre mão de tentar obter qualquer vantagem de Deus que se baseasse nos méritos. Ele se posta como um pecador que nada merece, humilhado em sua condição, e, assim, suplica ao Senhor que lhe tenha compaixão. Essa é a atitude correta da oração do verdadeiro servo de Deus, que sabe ser ele mesmo homem limitado e pecador diante de um Senhor que ocupa a posição de onipotente e santo.

Tais atividades, pela fé em Cristo, inevitavelmente revelam o afastamento do homem da religiosidade vazia e mostram sua proximidade do Deus vivo e verdadeiro. Livram o homem da escravidão produzida pela superstição e pelos conceitos intuitivos da divindade e o tornam livre para andar em comunhão com seu redentor. E mais: esvaziam as prateleiras dos servos de Deus de objetos que, no passado, pretendiam ser o alvo da sua fé. Afinal, o melhor livro aberto é a própria vida do crente, de cujas páginas reluz o verdadeiro brilho de Cristo.

Pr. Thomas Tronco

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