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Salmo 39 - Como Agir no Meio da Crise?

 

O mês de março de 2011 ficará marcado na história da humanidade como a ocasião em que o mundo viu uma grande tragédia: o tsunami no norte do Japão. Até antes de dezembro de 2004, quando um incidente da mesma natureza aconteceu na Indonésia, quase ninguém tinha ouvido falar do termo tsunami. De lá para cá, duas terríveis ocorrências fizeram o mundo não apenas conhecer o termo, mas também os fatores que causam os tsunamis e sua capacidade tremendamente destrutiva. Nesse período, o mundo também lamentou terremotos, guerras civis, ciclones, enchentes e grandes deslizamentos de terra.

Quando eventos catastróficos ocorrem, as pessoas, ainda que distantes, sentem um enorme pesar e são incomodadas com questões relativas às “razões de acontecerem coisas ruins perante os olhos de um Deus bom”. Diante disso, as reações das pessoas são as mais diversas. Uns dizem que Deus não existe. Outros, que ele não ama de verdade as pessoas e, por isso, não deve ser servido ou adorado. Há até quem, desejando justificar o Senhor – como se ele necessitasse de advogados –, diz que essas infelicidades são ocorrências alheias ao divino controle. Seriam apenas más sortes na esfera do acaso. Alguns desses “defensores” chegam a dizer, de modo absurdamente antibíblico, que Deus nem sequer sabia que tais catástrofes aconteceriam.

Apesar da tolice de tais afirmações, uma pergunta permanece: “Como os cristãos de verdade devem se comportar diante de tragédias e situações de crise?”. O Salmo 39 ajuda a responder, do ponto de vista do servo desejoso de honrar a Deus, como reagir quando o mundo parece desabar. O tema é tão importante para aqueles que pertencem a Deus, que Davi, autor do salmo, dirigiu a recém-escrita obra aos cuidados de Jedutum, um dos homens responsáveis pelo louvor a Deus no tabernáculo israelita (1Cr 25.1,3). Assim, o salmo seria repetidamente cantado e serviria de testemunho a todos os que adoravam, no tabernáculo, o Deus verdadeiro. A utilidade do salmo vem de ele apresentar quatro reações necessárias ao servo de Deus em tempos de crise.

A primeira reação é abster-se de murmurar contra Deus. O texto não revela a situação específica de Davi, mas é claro em informar que não se tratava de um problema qualquer. Davi atravessava uma grave crise. O v.13 deixa transparecer que ele corria risco iminente de morte, já que pede por livramento, segundo diz, “antes que eu parta e já não exista” (beterem ’elek we’ênenî). Essa é uma situação onde é comum se ver discípulos do Senhor sentirem-se no direito de murmurar até mesmo contra Deus. É como se tais pessoas imaginassem que Deus, ao não evitar o mal, dá permissão para que se digam absurdos, de modo irresponsável, sem que ele leve em conta. O salmista, talvez conhecedor dessa tendência humana, tomou providências para não incorrer nesse tipo de desvio. Ele se propõe o seguinte (v.1): “Guardarei os meus caminhos de pecar com a minha língua” (’eshmerâ derakay mehatô’ bilshônî). A tentação de falar o que era indevido era tão grande que Davi usa uma palavra forte para dizer como evitaria o mal. O verbo hebraico “guardar” (shamar), na forma do particípio, é o termo usado para se referir a um guarda, uma sentinela, um vigia.

Além de não querer pecar contra Deus, o salmista também estava preocupado com seu testemunho perante o mundo. Assim, quando põe freios na língua, o faz especialmente diante dos incrédulos: “Que eu coloque uma mordaça na minha boca sempre que o ímpio estiver na minha presença” (’asîmâ lepî mahsôm be‘od rasha‘ lenegdî). O interesse dos incrédulos não é, via de regra, meditar sobre a atuação de Deus diante do sofrimento e analisar o ensino bíblico que trata o assunto. Seu primeiro impulso é atacar o Senhor e justificar a postura humana de rebeldia e de incredulidade em relação a Deus. Davi, ainda que acometido pelo sofrimento, não queria injetar combustível na acusação pérfida dos pecadores. Resumindo, o salmista não acha que a situação difícil que vive é um passe livre para pecar falando coisas injustas, nem tampouco demonstrar ingratidão por todo o bem que Deus já lhe tinha feito.

A segunda reação é reconhecer a transitoriedade do homem. Uma dificuldade que os homens têm de atravessar as tragédias que os assolam é que eles, às vezes, colocam nessa vida sua esperança e seus objetivos finais. Essa é uma característica da vida de quem não tem a esperança da vida eterna. Contudo, os próprios servos de Deus podem se esquecer de onde está seu verdadeiro tesouro (Mt 6.19,20) e quanto tempo passarão na presença do Senhor na pátria celestial (1Ts 4.17). Quando isso acontece, o mundo presente passa a ser fator fundamental para dar sentido às suas vidas e ser fonte de felicidade. É natural, para quem vê a vida sob esse prisma falho, que ela perca o sentido quando as circunstâncias são dramáticas. O salmista parece não sofrer desse mal. Diante do sofrimento, ele olha para o caráter passageiro dessa vida a fim de aguçar sua esperança na vida futura. Diz ele ao Senhor (v.5): “A minha longevidade é como nada diante de ti. É certo que todo homem, incluindo aquele que é firme, não é mais que um sopro” (heldî ke’ayin negdeka ’ak kal-hevel kal-’adam nitsav). Essa visão da fragilidade do homem e do breve limite da vida faz com que o salmista não se surpreenda demais ao ver o sofrimento ao seu redor e o faça esperar pelo alívio da vida com Deus (Ap 21.4).

A terceira reação é buscar a purificação da vida. Davi, ao olhar para seu sofrimento, não acha que ele é uma má sorte de um curso cego. Ele sabe que Deus é soberano e que comanda o rumo da vida de cada ser humano (Sl 139.16). Sendo assim, o escritor vê, na sua situação, o propósito e a ação do Senhor, visto que declara (v.9): “Fico em silêncio e não abro minha boca, pois tu fizeste isso” (ne’elamtî lo’ ’eftah-pî kî ’attâ ‘asîta). A conclusão a que Davi chega, conhecendo suas próprias ações, é que, entre os desígnios insondáveis do soberano, está presente uma ação disciplinar. Portanto, sem perder mais tempo, ele roga (v.8): “Livra-me de todos os meus pecados” (mikal-pesha‘ay hatsîlenî). Isso não quer dizer que todo sofrimento da vida seja uma disciplina de Deus. Mas, certamente, cada um conhece seu próprio andar e tem bases para avaliar o modo de Deus tratá-lo. De qualquer forma, o sofrimento é sempre uma oportunidade e um convite ao arrependimento e à conversão, já que o homem se depara com sua fraqueza diante do poder do Todo-poderoso que é santo.

A última reação necessária ao servo de Deus que atravessa uma crise é dobrar-se em oração ao soberano. Essa reação pode parecer obvia, mas, em muitos casos, custa muito a ser efetivada. O homem, diante da crise, tem muito mais inclinação para a murmuração e para busca das próprias soluções do que a disposição de depender de Deus e orar pedindo alívio e direção. Muitas vezes, por arrogância e auto-suficiência do homem, essas atitudes tipicamente cristãs são aplicadas somente quando não há mais recursos. Davi não apresentou essa postura. Ao ver o perigo se acercando dele, se curvou diante de Deus e pediu (v.12): “Ouve a minha oração, ó Senhor, e dá ouvidos à minha súplica” (shim‘â-tefillatî yehwâ weshaw‘atî ha’azînâ). Independente das circunstâncias, Deus sempre quer que seus servos levem a ele suas petições e lhe apresentem, com atitude de submissão, seus sofrimentos e tristezas (Fp 4.6) – principalmente em momentos como esse.

As notícias de tragédias continuarão a ocupar os noticiários. Por mais que a humanidade desenvolva novas tecnologias de previsão e de prevenção de catástrofes, é certo que ainda veremos muito sofrimento acometer a humanidade. Nessas horas, em lugar de tentar definir o que se não pode esquadrinhar (Rm 11.33-35), a igreja de Cristo deve se portar como um servo de um bom rei e não como um cliente mal atendido de um restaurante. Os discípulos de Cristo, em lugar de questionar a sabedoria e a bondade do Senhor, devem aproveitar para divulgar a mensagem da cruz de Cristo ao mundo perdido. Devem, também, deixar de rebaixar o Senhor a um espectador impotente diante dos eventos do mundo com a finalidade de protegê-lo de críticas. Em lugar disso, devem proclamar sua soberania, pela qual ele guiará a história da humanidade até o “Dia do Senhor” – o juízo do mundo –, quando separará os que lhe pertencem daqueles que receberão a punição por rejeitarem a Cristo. Devem os servos de Deus, em todo momento, testemunhar que o Senhor, em lugar de produzir um céu na Terra, ou as bênçãos do futuro no tempo presente, é aquele que, em “verdadeiro amor”, enviou seu Filho para dar a vida pelos pecadores (Jo 3.16; 1Jo 4.10) a fim de conduzi-os à eterna pátria onde nada mais os abalará.

Pr. Thomas Tronco

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