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Introdução a Ageu e Zacarias

 

Antes de abordar o texto bíblico de Ageu e Zacarias, é necessário que se faça uma apresentação introdutória do contexto desses livros, o que faremos de maneira sucinta e acessível, levando em conta o caráter desse trabalho e o público a quem se destina.

Tanto Ageu como Zacarias iniciaram suas profecias na segunda metade do ano 520 a.C., em Jerusalém. Ageu encerrou seus discursos antes do final daquele ano, enquanto Zacarias atuou por mais dois anos. O fato de atuarem concomitantemente faz com que também sejam citados juntos por Esdras, o qual lhes conferiu o mesmo status e função (Ed 5.1; 6.14). Já Ageu ser citado antes pode sugerir que ele fosse mais velho que Zacarias. Ageu também devia ser mais conhecido, pois, enquanto Zacarias é apresentado por sua filiação — “filho de Ido” (Ed 5.1), ou “neto de Ido” (Zc 1.1, “filho de Baraquias, filho de Ido”) —, Ageu é simplesmente chamado “o profeta” (Ag 1.1, heb. hannavi’).

Quando esses profetas iniciam seus ministérios, pelo menos no que diz respeito ao que foi registrado nas Escrituras, o povo de Judá havia voltado do exílio na Babilônia. Ciro, que derrotou a Babilônia em 539 a.C., autorizou, no ano seguinte, que os judeus voltassem ao seu país a fim de o repovoarem e ordenou a reconstrução do templo (Ed 1.1-4), devolvendo os utensílios sagrados e determinando que os judeus fossem assistidos em tudo pelos povos que os cercavam.[1] Em 537 a.C., cerca de 50 mil pessoas empreenderam a jornada da Babilônia até a Judeia (Ed 2.64,65). Tendo se estabelecido na terra, reergueram o altar, reinstituindo assim os sacrifícios, sete meses após sua chegada (Ed 3.1-7). Após um período de preparação, que envolvia a busca de madeiras no Líbano, em maio/junho de 536 a.C.[2] a obra de reconstrução foi iniciada com grandes e divergentes emoções (Ed 3.8-13). Por diversas razões que serão tratadas adiante, depois de algum tempo a obra parou.

No ano 520 a.C., a construção já estava parada havia cerca de dezesseis anos. A negligência do povo, deixando a construção praticamente no alicerce por uma década e meia era algo inesperado para as cerca de 50 mil pessoas que retornaram do exílio, já que seu ânimo e os sentimentos nacionalista e religioso eram substanciais. Entretanto, devido a problemas nascido no desânimo dos antigos, no egoísmo e desejo materialista, no desprezo da mensagem da restauração futura e na falta de familiaridade com o templo por parte daqueles que nasceram na Babilônia,[3] a chama em seus corações, vista claramente no início da obra, foi perdendo o brilho até que se apagou.

Apesar de Deus não ter feito questão de uma “casa” quando Davi se propôs construí-la, explicando ao rei de Israel que ele não tinha necessidade de uma habitação física (2Sm 7), no período pós-exílico, ou seja, depois do retorno do povo da Babilônia, o Senhor não apenas exigiu a construção do templo como também exortou e puniu o povo de Judá por negligenciá-la. É quando surgem Ageu a Zacarias pregando e exortando os judeus a valorizar a casa do Senhor e se empenhar na reconstrução.

Nesse sentido, há uma grande diferença entre a abordagem do templo pelos profetas pré-exílicos e pelos profetas pós-exílicos. O profetas pré-exílicos anunciavam o juízo, inclusive sobre a capital, Jerusalém, afirmando que Deus faria com que o templo fosse destruído (Jr 26.18 cf. Mq 3.12). Naqueles dias, o povo se apegava justamente à esperança de que o templo, por marcar a presença de Deus entre a nação, seria a causa de Jerusalém resistir a qualquer ataque. O profeta Jeremias revela a valorização supersticiosa dos judeus em relação ao santuário afirmando que eles se negavam a dar ouvido aos avisos proféticos, dizendo entre si: “Este é o templo do Senhor, o templo do Senhor, o templo do Senhor! (Jr 7.4b).

Curiosamente, a Jerusalém pós-exílica pensava o oposto, desvalorizando o templo, sem fazer questão de reedificá-lo. Desse modo, em vez de anunciar a destruição do templo, os profetas Ageu e Zacarias trabalharam no sentido de animar e encorajar o povo à sua construção, apontando as consequências da negligência, os benefícios da obediência e as esperanças escatológicas ligadas à existência daquela casa. Segue abaixo um quadro sobre as datas identificáveis nos livros dos dois profetas.[4]

 

Ageu

Zacarias

29 de agosto de 520

1.1

 

21 de setembro de 520

1.15

 

17 de outubro de 520

2.1

 

Outubro ou novembro de 520

 

1.1

18 de dezembro de 520

2.10,18,20

 

15 de fevereiro de 519

 

1.7

7 de dezembro de 518

 

7.1


Uma parte notável na mensagem de Ageu e Zacarias — e de outros profetas — é o papel do templo como peça fundamental da esperança messiânica e de restauração (Is 2.2,3; Mq 4.1,2). Ezequiel 37, enfatizando a restauração de Israel como um só reino e povo, debaixo do governo do descendente de Davi e em obediência e santidade, tinha o templo com um fator integrante e fundamental: “Minha morada estará com eles; eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo. Então, quando o meu santuário estiver entre eles para sempre, as nações saberão que eu, o Senhor, santifico Israel” (Ez 37.27,28). Assim, com o conhecimento escatológico que eles tinham na época, sabiam que precisavam do templo reconstruído por três razões: aguardar o Messias, se preparar para a restauração ampla da nação e promover a glória de Deus. A negligência com a obra do santuário afetava frontalmente esses três objetivos e os fazia andar longe das ordens e dos objetivos do Senhor, demonstrando descaso com a revelação de Deus e com as esperanças graciosamente concedidas a eles.

Felizmente, o ministério de Ageu e Zacarias, pela graça de Deus, foi bem sucedido. Por causa das suas exortações, a obra recomeçou (Ed 5.1,2), mas não sem enfrentar novamente oposição externa (Ed 5.3). O que os inimigos dos judeus não esperavam era que o imperador Dario Hystapes, avisado por eles da obra, mandasse procurar e encontrasse o decreto no qual Ciro ordenava a reconstrução do templo com os custos a serem pagos pelo Estado (Ed 6.1-5). Assim, Dario confirmou aquele decreto sob pena de morte para quem o descumprisse (Ed 6.6-12) e a obra foi concluída em 12 de março de 515 a.C. (Es 6.15).

Diante disso tudo, não é difícil notar as diferenças e semelhanças entre o povo judeu daqueles dias e a igreja de hoje. No campo das diferenças estão as previsões da aliança mosaica sobre o tratamento de Israel diante da obediência ou da rebeldia em um sistema de recompensa e castigo[5] (Lv 26; Dt 28), algo que não se aplica à igreja na forma de um acordo entre duas partes, e também a detalhes da esperança escatológica que, no caso de Israel, não envolve apenas restauração espiritual, mas também nacional. Entre as semelhanças estão o desejo de Deus de ser obedecido e honrado por seus servos, as dificuldades que os homens têm nesse campo devido ao egoísmo e orgulho e, ainda, as consequências de se manter rebelde e apático diante da obra do Senhor.

Esses livros nos chamam a olhar para o passado de Israel e da igreja, avaliar no presente nossos impulsos e nosso comprometimento com Deus e com suas orientações e, finalmente, vislumbrar o futuro escatológico com esperança tal que produza fidelidade a Deus digna dos cidadãos da pátria celestial. Também apontam para a exclusividade do caminho de acesso à comunhão com Deus, no passado pelo sangue de animais oferecido em fé no templo e no presente por meio do sangue de Cristo (Hb 10.19-23).[6] Por isso, mais que nunca é importante e relevante para os servos de Deus dar ouvidos ao que o Senhor revelou e ensinou por meio de Ageu e Zacarias.

Pr. Thomas Tronco


[1] Merrill, Eugene. História de Israel no Antigo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD, 2007, p. 522.

[2] Walvoord, J. F.; Zuck, R. B. The Bible Knowledge Commentary: Old Testament. Colorado Springs: David C. Cook, 1983, p. 659.

[3] Pinto, Carlos Osvaldo Cardoso. Foco e Desenvolvimento no Antigo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2006, p. 778.

[4] Informações adicionais em Baldwin, J. G. Ageu, Zacarias e Malaquias: Introdução e Comentário. Série Cultura Bíblica. São Paulo: Vida Nova, 2006, 23.

[5] Zuck, Roy. Teologia do Antigo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD, 2009, p. 454.

[6] LaSor, William S.; Hubbard, David A.; Bush, Frederic W. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2003, p. 429.

 

 

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