Qualidades do Pregador do Evangelho
Charles H. Spurgeon (1834-1892), conhecido como “o príncipe dos pregadores”, dirigiu uma famosa escola que treinava homens para o ministério cristão. Em uma de suas aulas, sobre o tema “pregação ao ar livre”, ele contou a história de um missionário na Irlanda, país de tradição religiosa romanista, chamado Gideon Ouseley (C. H. Spurgeon, Lições aos Meus Alunos, Vol.1, Fiel, 1990, p. 80-83). Esse homem, sabiamente, costumava pregar diante de vidraças de farmácias e de casas de católicos para reprimir a fúria dos “atiradores” que, duvidosos de sua pontaria, evitariam lhe jogar tantas coisas.
Em uma de suas pregações, contou Spurgeon a seus alunos, Ouseley, de uma escadaria em frente ao mercado de Enniscorthy, começou a atrair ouvintes ao cantar um hino. A curiosidade promoveu um clima ameno entre os transeuntes até o final da oração do pregador. Entretanto, bastou iniciar a mensagem para que Gideon Ouseley fosse alvo, primeiro, de legumes velhos, batatas e nabos e, depois, de cacos de telha e pedras, os quais causaram alguns ferimentos leves.
Nesse momento, o pregador surpreendeu a multidão ao dizer que sua mensagem lhes seria agradável, pois era sobre a “bendita virgem”. A violência cessou e a atenção do público estava toda sobre o homem. Ele passou a narrar o casamento em Caná da Galileia, quando a “virgem mãe” notificou o Salvador de que os noivos não tinham mais vinho e, voltando-se para um criado, conhecedora do coração e do caráter do filho, disse-lhe: “Faça tudo o que ele lhe disse” (Jo 2.5).
A partir de então, Ouseley passou a citar frases de Jesus, tais como “esforçai-vos por entrar pela porta estreita, pois eu vos digo que muitos procurarão entrar e não poderão” (Lc 13.24) e “quem não nascer da água e do Espírito não pode entrar no reino de Deus” (Jo 3.5), completando-as com a frase: “Faça tudo o que ele lhe disse”. Em dado momento, irrompeu, dentre a multidão, uma voz: “Você está certo, está certo”.
Essa história me lembra duas disposições necessárias a todo cristão, exemplificadas nessa experiência de Gideon Ouseley:
1. O compromisso de pregar o Evangelho. O evangelismo é uma ordem (Mt 28.19; At 1.8) que deve ser cumprida pela igreja de Cristo como vocação (1Pe 2.9) e com total empenho e desprendimento (2Tm 4.2). Mesmo quando é alto o custo de falar das boas novas da salvação, o crente não deve se intimidar ao falar de Jesus (At 4.18-21; 2Tm 1.8), dependendo do auxílio e proteção de Deus (At 18.9-11).
2. O aprendizado e a memorização das Escrituras. Não é possível falar sobre aquilo que não se conhece. A habilidade de Ouseley, narrada acima, só foi possível porque ele conhecia bem a Bíblia e podia usá-la como uma ferramenta. Sem o conhecimento da Palavra de Deus, não é possível ensinar, exortar ou corrigir (2Tm 3.16,17). É preciso estar preparado para apresentar as razões na nossa fé (1Pe 3.15), embasando-a na sua fonte. Sem o conhecimento e a aplicação das Escrituras, não há, de fato, evangelismo (Rm 1.16).
Por um lado, é correto pensar que seria muito bom termos de volta Gideon Ouseley a fim de pregar o evangelho com tanta ousadia, sabedoria e conhecimento da Palavra. Por outro, são irrelevantes a presença ou a ausência de certos nomes, visto que à igreja, como todo, foram dados tanto as Escrituras como o chamado e a capacitação para o evangelismo. Muitos Gideons Ouseleys podem e devem pregar hoje, inclusive dentre os da nossa igreja.
Temos de ter coragem, comprometimento e ousadia para falar de Jesus e conduzir a ele os perdidos. É certo que muitas vezes nos arremessarão pedras e cacos de telha, mas nos empenhamos na santa esperança de ouvir, no meio da turba, alguns que digam: “Você está certo, está certo”.
Pr. Thomas Tronco