Gálatas 5.13-15 - O Amor é o Cumprimento da Lei
O convite para crer em Cristo é uma vocação para ser livre não só do mundo, do pecado e da perdição, mas também do fardo que a Lei Mosaica impõe aos que tentam viver sob suas determinações (5.1). Essa é a lição que Paulo repisa em toda a Carta aos Gálatas. Contudo, certamente em virtude das acusações que lhe estavam sendo dirigidas de pregar uma mensagem que induzia os crentes ao desregramento, o Apóstolo vê nesta altura, a necessidade de apresentar um contrapeso. Assim, passa a ensinar que a liberdade a que o crente foi chamado não implica uma vida em que são dadas asas às inclinações naturais (1Pe 2.16). Antes, essa liberdade deve conduzir a uma forma nova de escravidão: a escravidão do amor. Paulo ensina, então, que em vez de usar a liberdade cristã para servir suas próprias paixões, o crente deve usá-la para servir amorosamente aos seus irmãos (13. Vd. tb. 1Co 8.9,13).
É preciso, portanto, compreender que a pureza e o amor são as cercas da liberdade do crente. É somente dentro desses limites que a liberdade se mantém saudável e verdadeira, sendo certo que ao ultrapassar tais fronteiras, ela se desfigura, transformando-se em escravidão ao pecado (Jo 8.34; 2Pe.2.17-19).
A ênfase sobre o amor aos irmãos é notável no parágrafo em análise. Paulo deixa transparecer com isso o fato de que os crentes da Galácia não tinham apenas problemas doutrinários. Eles também tinham sérios problemas de relacionamento, havendo terríveis atritos entre os crentes. Fica evidente no texto que na Galácia as igrejas acolhiam falsos mestres e feriam verdadeiros irmãos! Por isso, Paulo, além de mostrar que a liberdade que Cristo dá deve conduzir ao amor que se dispõe ao serviço dos santos, também mostra que o dever de amar consta da própria Lei como uma ordem que resume todos os demais mandamentos (14).[1] É óbvio que a menção da Lei aqui não é despropositada. Paulo está escrevendo a pessoas que diziam ter os preceitos mosaicos em alta conta. Na verdade, é como se dissesse: “Vocês realmente querem cumprir a Lei? Muito bem. Então amem-se uns outros, pois toda a Lei se resume nesse mandamento e, curiosamente, ele não tem recebido a atenção devida por parte de vocês que se apresentam como zelosos cumpridores das determinações de Moisés!”
No v. 15 percebe-se o grau de atrito que havia entre os crentes galateus. Ao usar os verbos “morder” (δάκνω) e “devorar” (κατεσθίω), o Apóstolo sugere a figura de animais selvagens brigando ferozmente entre si, cada qual tentando brutalmente estraçalhar e destruir o outro, em meio à completa balbúrdia, gritos e confusão. É claro que a figura sugerida por Paulo tem um toque de exagero com o intuito de dar maior impacto à admoestação. No entanto, considerando a lista das “obras da carne” constante de 5.19-21, bem como a exortação de 5.26, parece certo que nas igrejas da Galácia existiam chocantes problemas de inimizade.
A partir disso tudo, é fácil concluir que o ministério dos mestres legalistas, com sua ênfase sobre uma religião mecânica e cerimonialista, conduzia os homens ao apego a meras formalidades exteriores. Assim, os crentes não davam atenção às virtudes espirituais e jamais as cultivavam. O resultado era a divisão e a discórdia, pois os vícios da alma de uma pessoa fatalmente são sentidos por aqueles que estão ao seu redor. Esse fato pode ser verificado em qualquer grupo social. Aliás, é curioso perceber na atualidade, que, tal como na Galácia, igrejas apegadas a um sem número de regras são verdadeiros palcos de intrigas, provocações e calúnias. A religiosidade puramente externa consome totalmente o tempo e a atenção, não deixando espaço para o cuidado da espiritualidade interna. Ora, quando se descuida do coração, ele passa a produzir espinhos que cedo ferem os que se aproximam. Paulo alerta que esse estado de coisas, com as brigas que gera, fatalmente conduz à destruição de todos, ou seja, a feridas incuráveis em indivíduos a ao fim da igreja como um núcleo cristão de comunhão e testemunho (Jo 13.35).
Pr. Marcos Granconato
[1] O mesmo ensino encontra-se em Romanos 13.9-10. Observe-se que há aqui um eco do ensino de Jesus que disse que toda a Lei e os Profetas se sustentam em apenas dois preceitos: amar a Deus e amar ao próximo (Mt 22.35-40).