Sábado, 12 de Outubro de 2024
   
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Salmo 95 - Quem não É por nós É contra nós

 

Em uma gincana em que várias equipes competiam, certo grupo tinha grande esperança de acabar entre os primeiros colocados, pois contava com pessoas de talentos variados que fariam a equipe se destacar em quase todas as modalidades da competição. Tudo corria bem até que seu membro mais forte acabou se ferindo em uma prova que envolvia corrida. O problema não foi aquela prova, mas uma das mais esperadas do dia: o cabo de guerra. O membro da equipe que se feriu era quem sempre fazia a balança pender para o lado da sua equipe. Entretanto, ele não poderia, nesse ano, colaborar como nos anos anteriores. Mesmo assim, decidiu integrar o grupo que iria puxar o cabo, simplesmente supondo que, mesmo fraco, ele seria mais útil que os outros. Mas bastou o árbitro apitar, dando início à disputa, para aquele rapaz perceber que não tinha a menor condição de fazer qualquer esforço. E, pior: além de não ajudar, estava atrapalhando, pois tirou a oportunidade de outra pessoa colaborar com a equipe. A derrota fez com que ele e seu time aprendessem que, em várias ocasiões, não há meio-termo. Ou se está a favor, ou se está contra.

O Salmo 95 vislumbra essa mesma possibilidade. Entretanto, o que estava em questão não era um evento esportivo, mas o relacionamento entre Israel e seu Senhor. O contexto da composição do salmo não é declarado. Apesar de alguns estudiosos proporem que o chamado ao louvor logo de início indica que o texto seria um convite oficial para a celebração de uma das festas de Israel – talvez a festa dos Tabernáculos –, ou parte de um ritual festivo que era cantado pelos sacerdotes e respondido pela congregação, a evidência interna parece apontar para um chamado do povo para louvar e agradecer a Deus por uma libertação militar. Isso explicaria a descrição de Deus como “rocha da nossa salvação” (v.1) e como um pastor que cuida do rebanho que lhe pertence (v.7). Uma peculiaridade desse salmo, a exemplo do Salmo 81, é que Deus, por meio do salmista, interage com Israel exortando-o a permanecer fiel. Assim, com os dizeres do salmista e do próprio Senhor, o Salmo 95, em meio ao chamado e à santa instrução, divide as pessoas em dois grupos segundo o modo como se comportam diante de Deus e da sua dignidade louvável.

O primeiro grupo é formado por aqueles que adoram ao Senhor. A primeira parte do salmo contém dois convites à adoração. O primeiro diz (vv.1,2): “Vamos! Celebremos ao Senhor. Aclamemos à rocha da nossa salvação. Entremos na sua presença com ações de graça. Aclamemos a ele com salmos” (lekû nerannenâ layhwh narî‘â letsûr yish‘enû neqaddemâ panayw betôdâ bizmirôt narîa‘ lô). Alguns aspectos da adoração são descritos nesse chamado como um louvor cantado que não é fruto de uma ação mecânica entediante, mas vindo de um coração alegre, da iniciativa de se aproximar de Deus com gratidão verdadeira, reconhecendo sua ação benéfica e graciosa e do desejo de oferecer um louvor mais que o “politicamente correto”. Na verdade, esse louvor deveria ser recheado de exultação e aclamação digna do Rei dos reis. O segundo convite completa a ideia, clamando (v.6): “Venham! Prostremo-nos e encurvemo-nos. Ajoelhemo-nos perante o Senhor, nosso criador” (bo’û nishtahaweh wenikra‘â nivrekâ lifnê-yhwh ‘osenû). Pinta-se o quadro do governante real perante quem se ajoelham os súditos em humildade, reverência, honra, admiração e amor – deve-se observar o uso de três verbos sequenciais que indicam o ato de se encurvar.

Sabendo que a convocação exigia comprometimento total dos adoradores e reconhecimento pleno das prerrogativas divinas, o salmista motiva seus leitores com duas razões para atenderem o chamado – ainda que o Senhor, para ser adorado, não precisasse de apresentações, referências ou explicações. A primeira razão é a supremacia de Deus sobre sua criação (v.3): “Pois o Senhor é um Deus grandioso e um rei grandioso acima de todos os deuses” (kî ’el gadôl yehwâ ûmelek gadôl ‘al-kol-’elohîm). Apesar de as Escrituras revelarem a inexistência de outros deuses, a intenção do salmista parece ser a de apontar para a proteção de Israel diante das nações vizinhas que confiavam em seus deuses (Ex.: 2Rs 18.28-35 cf. 19.35-37). Desse modo, o poder de Deus para vencer as nações poderosas é lembrado pela maior demonstração do seu poder, a saber, a criação do universo e seu domínio sobre tudo que existe (vv.4,5): “As profundezas da Terra estão em suas mãos e os picos das montanhas são dele. O mar é dele, pois ele o criou e as suas mãos formaram a terra firme” (’asher beyadû mehqerê-’arets wetô‘afôt harîm lô ’asher-lô hayyam wehû’ ‘asahû weyavveshet yadayw yatsarû). Para não deixar que essa visão se tornasse impessoal ou distante dos ouvintes, o salmista arremata (v.6) chamando o Senhor de “nosso criador” (‘osenû). A outra razão é o cuidado divino para com os seus na figura de um pastor de ovelhas, fazendo, talvez, menção a uma demonstração recente desse cuidado (v.7a): “Pois ele é o nosso Deus e nós somos povo do seu pasto e ovelhas da sua possessão” (kî hû’ ’elohênû wa’anahnû ‘am mar‘îtô wetso’n yadô).

O segundo grupo é formado por aqueles que resistem ao Senhor. Nesse ponto, o Senhor passa a falar exortando o povo a não apenas atender o convite, mas a atendê-lo corretamente, com o coração quebrantado e não com rebeldia (vv.7b,8a): “Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais os vossos corações” (hayyôm ’im-beqolô tishma‘û ’al-taqshû levavkem) – a mudança de interlocutor no meio do v.7 pode, a princípio, não parecer natural, mas ela concorda com os pronomes pessoais do v.8 e é comprovada pelo uso do salmo no Novo Testamento (Hb 3.7,8,13,15; 4.7). Como é comum que exortações como essa sejam respondidas, pelos homens, com uma autoconfiança que não faz jus à nossa fraqueza, Deus oferece exemplos de pessoas que tinham todas as motivações para servir a Deus adequadamente e que, não obstante, se endureceram e se rebelaram (v.8): “Não endureçais os vossos corações como em Meribá, como no dia de Massá, no deserto” (’al-taqshû levavkem kimrîvâ keyôm massâ bammidbar). “Meribá” e “Massá” – literalmente, “reclamação” e “tentação” – foram os nomes dados ao lugar em que Israel, mesmo depois de ser beneficiado pela poderosa libertação divina da servidão no Egito, murmurou ofensivamente contra Deus quando se viu sem água em Refidim, próximo do monte Sinai (Ex 17.1-7). Sobre esse episódio, Deus completa (v.9): “Onde vossos pais me puseram à prova e me tentaram, embora tenham visto os meus feitos” (’asher nissûnî ’avôtêkem behanûnî gam-ra’û pa‘olî).

É claro que essa não é uma informação sem propósito como velhas histórias contadas nostalgicamente pelos antigos. Deus está alertando o povo para uma condição atual que podia ser comparada à rebeldia do passado. Desse modo, a reprovação da geração do êxodo é um alerta para a geração presente de que, caso insistissem em seguir seus caminhos à parte de Deus e em desobediência, o mesmo veredito lhes seria dado (v.10): “Senti repugnância [daquela] geração por quarenta anos e disse: um povo de coração extraviado é o que eles são. Eles não reconhecem os meus caminhos” (’arba‘îm shanâ ’aqût bedôr wa’omar ‘am to‘ê levav hem wehem lo’-yod‘û derakay). O desfecho do desagrado de Deus pela geração rebelde, incrédula e ingrata foi que eles não usufruíram da promessa de entrar e herdar a terra prometida (v.11): “Assim, na minha ira eu jurei: eles não entrarão no meu lugar de descanso” (’asher-nishba‘tî be’affî ’im-yevo’ûn ’el-menûhatî). Na verdade, aquela geração morreu no deserto e, quarenta anos depois do êxodo, a segunda geração entrou em Canaã, desapossou os povos locais e herdou a terra da promessa. Nesse caso, os israelitas dos dias do salmista – e das gerações posteriores – deveriam decidir se queriam ter esse “lugar de descanso” concedido por Deus – ou seja, paz, prosperidade e permanência na terra de Canaã –, ou se queriam ser alvo do juízo de Deus pelas mãos das nações estrangeiras e pelos revezes naturais que lhes recairiam caso se endurecessem diante do Senhor (cf. Dt 28.15-68).

Apesar de ser um salmo composto em Israel e dirigido a israelitas, o uso que o Novo Testamento faz dele o torna diretamente aplicável à igreja e extremamente relevante – guardadas as formas específicas com as quais o Senhor escolheu tratar com Israel, dentro da aliança mosaica, e com a igreja. O fato é que, mais do que nunca, deve ficar em relevo, na mente dos crentes, o chamado que eles possuem de louvar a Deus (Ef 5.19,20; Cl 3.16) e de anunciar suas grandezas (1Pe 2.9), sem, de modo algum, se endurecerem contra Deus naquilo que ele requer e naquilo que ele revela pela sua Palavra. Deus também demonstrou poder e amor pelos pecadores que ele buscou por meio da fé, cujos pecados ele perdoou, transformando-os em novas criaturas, filhos de Deus, alvos da sua misericórdia: “Vós, sim, que, antes, não éreis povo, mas, agora, sois povo de Deus, que não tínheis alcançado misericórdia, mas, agora, alcançastes misericórdia” (1Pe 2.10). Desprezar tal graça, rejeitar as orientações reveladas nas Escrituras e cultivar um caráter ofensivo à santidade de Deus é fazer o mesmo que houve em Meribá e Massá. Fazer isso é negligenciar o chamado que torna os servos de Deus “naqueles que adoram ao Senhor”. É, também, com coração duro, integrar o grupo “daqueles que resistem ao Senhor”. Você tem certeza de que deseja permanecer em rebeldia e pertencer a esse grupo?

Pr. Thomas Tronco

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