Um Novo Ingrediente Antigo
Qual é a receita da santidade? Já li muitos livros que respondem a essa pergunta. Todos eles falam sobre negar-se a si mesmo, dedicar-se à leitura bíblica, desenvolver o hábito da oração, cultivar o convívio junto aos irmãos da fé... Todas essas diretrizes são corretíssimas e somente um maluco, do tipo que pensa que é Napoleão Bonaparte, seria capaz de, sendo cristão, negar a importância de qualquer uma delas.
Há, porém, um ingrediente na receita bíblica da santidade que nem sempre é mencionado como remédio capaz de curar a fraqueza, a depravação e o desvio. Esse ingrediente é o amor. Notem bem: eu não estou dizendo que os livros evangélicos não tratam desse tema. Eles tratam e talvez o abordem até mais do que qualquer outro assunto. O que quero dizer é que raramente os livros evangélicos apontam o amor como fator que enfraquece o mal que há em nós e estimula a pureza na vida diária.
É curioso, porém, que o texto transcrito acima indica exatamente esse vínculo entre amor e santidade. Há, de fato, uma conexão entre os versículos 12 e 13 do tipo que estabelece entre ambos uma relação de meio e propósito. Isso fica claro no texto grego, ainda que algumas traduções nem sempre deixem transparecer esse nexo entre os dois versículos.
Deixem-me explicar melhor. Paulo estava com saudades dos tessalonicenses e orava pedindo duas coisas. Primeiro: que Deus removesse os obstáculos do caminho até eles (parece ser esse o sentido original da expressão traduzida como “nos encaminhem a vocês”). Com efeito, o diabo tinha criado barreiras para a visita de Paulo (2.18). Por isso, ele orava pedindo a Deus que limpasse aquele trajeto. Segundo: que o Senhor os fizesse crescer em amor pelos demais crentes e por todos os homens (isso incluía os seus opositores citados em 1.6; 2.14 e 3.3), de forma que chegassem no mesmo nível de amor que Paulo nutria por eles. A frase que expressa esse ideal de imitação é muito ambígua no grego e, por isso, há traduções diferentes em que a noção do amor de Paulo como padrão desaparece. Contudo, uma vez que o apóstolo costuma se apresentar como modelo para os crentes em geral (1.6), é bem provável que a tradução adotada aqui seja a correta.
Tendo mencionado seu segundo pedido de oração, o apóstolo prossegue apontando a que o crescimento no amor vai conduzir, isto é, a um coração forte. Isso significa que o crente que ama intensamente provará uma realidade interior marcada por firmeza, coragem e perseverança. Em outras palavras: tendo muito amor, os tessalonicenses seriam também muito fortes! O que se vê aqui, portanto, é exatamente o contrário do que sugerem às vezes por aí, quando apresentam pessoas amorosas como gente ingênua, frágil e carente de amparo.
E Paulo vai adiante. Tornando-se fortes por causa do grande amor que porventura cultivassem, os tessalonicenses também seriam modelos de virtude. Eles não poderiam ser acusados de nada (esse é o sentido da palavra traduzida como “irrepreensível”) e se separariam de toda forma de mal com o objetivo de serem úteis no serviço a Cristo (esse é o sentido da palavra “santo”).
É curioso notar que a linguagem adotada no versículo 13 sugere o cenário de um tribunal em que Deus figura como juiz. Paulo está, assim, ensinando que os crentes que amam de verdade se transformam em pessoas fortes que podem comparecer serenas diante do Juiz Supremo, posto que não se deixam levar pelo mal e empregam sua vida apenas no serviço dele.
Eis aí, então, mais um ingrediente bíblico para a receita da santidade: o amor! Isso, fatalmente, joga no lixo a figura do santarrão que é ranzinza, carrancudo e distante das pessoas. Esse tipo de “santão” é só um ator antipático que, cedo ou tarde, se envolverá em algum escândalo. O “santão” de verdade, ao contrário, é o crente que adquiriu a força de caráter que vem da prática de um amor gigante. Por isso, fica aqui o desafio: cresça em amor se quiser adquirir força interior na luta contra o mal. Cresça em amor se quiser mesmo ser um homem santo.
Pr. Marcos Granconato
Non nobis, Domine