Quinta, 25 de Abril de 2024
   
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O Lavrador e o Carpinteiro

Pastoral

Foi com pesar que recebi, nessa semana, a notícia da morte do meu avô. Foi com pesar porque convivi com ele a maior parte da minha infância e tive nele talvez o meu primeiro professor de Teologia, o mestre que desde cedo me apresentou as lições básicas da fé.

E não somente isso. Meu avô não foi só um professor para mim. Ele também foi um bom amigo — aliás, um amigo muito alegre e divertido, daquele tipo que quando chegava deixava a casa toda feliz. Diferente de muitos adultos impacientes, ele jamais tratou os netos com rispidez, jamais os desprezou ou fez distinção entre eles. Em vez disso, sempre os tratou com calorosa simpatia, mostrando que gostava de todos nós, sem preferências ou favoritismo.

Ao dizer isso, talvez pensem que meu avô fosse do tipo que sempre nos dava doces ou brinquedos. Ledo engano! Meu avô nunca me deu um presente, nenhum sequer. Nem nos meus aniversários, nem nos dias de Natal, nem em ocasião nenhuma. Nada. De fato, não me lembro de ter ganhado dele coisa alguma.

Contudo, o amor dele por nós era tão grande que eu nunca atinei para esse fato. Na verdade, só agora isso me veio à mente. Assim, ele conseguiu ser meu avô por quase cinquenta anos e, sem me dar doces, brinquedos ou livros coloridos na infância, sem me dar sequer um par de meias na fase adulta, nunca notei isso. Jamais senti falta desses gestos e acho que isso aconteceu porque meu avô não precisava nos dar nada pra fazer a gente se sentir querido e respeitado por ele. A verdade é que o maior presente de meu avô para mim foi o exemplo de uma vida séria de zelo pela Palavra de Deus e de cuidado para com a igreja.

Isso me faz pensar na importância da vida dele para todos nós. Passei as últimas décadas da minha vida ouvindo acerca da maravilha que existia no fato de um homem semianalfabeto ser o patriarca de uma família de doutores e pessoas letradas. Realmente, isso é algo fantástico! Porém, quando considero o real legado do meu avô, penso que quando a graça alcançou aquele humilde lavrador nas plantações de café do Paraná, Deus tinha algo muito maior em mente.

Sim, quando o carpinteiro de Nazaré visitou o humilde lavrador, ele buscava criar não primariamente uma estirpe de doutores. De fato, quando as mãos perfuradas do carpinteiro tomaram as mãos calejadas do lavrador a fim de guiá-lo, seu alvo era a expansão do Reino e não das letras. E o lavrador entendeu isso. Sei que ele entendeu porque sempre que se viu cercado de homens de letras, nunca buscou neles a erudição. Antes, buscou neles o amor pelo Reino. E se não via nesses doutores amor e zelo pelo Reino, o lavrador os exortava sem temor.

O corpo do meu avô está num caixão. Como o carpinteiro foi ao encontro do lavrador no campo, há tantos anos, o lavrador foi ao encontro do carpinteiro. Estou triste, confesso. Queria ouvir que ainda está por perto o homem que nunca me deu nada e tanto me enriqueceu; que nunca teve um diploma e tanto me ensinou...

Porém, a morte dele faz acender em meu peito já cansado a razão sublime pela qual a graça o buscou naquele dia antigo entre os vastos campos do Paraná, ou seja, o alvo de expandir o Reino, provando aos homens que a verdadeira sabedoria não está nas vaidades que tanto perseguimos, nem no desvendamento dos mistérios teológicos que nos desafiam. A verdadeira sabedoria está, isto sim, aos pés do divino carpinteiro que busca os homens em todos os rincões da Terra, seja nas casas dos poderosos ou nas monótonas plantações de pés de café.

Obrigado, Senhor, por ter-me feito neto do lavrador que um dia seguiu o carpinteiro. Obrigado porque, por intermédio do lavrador, o Senhor me levou ao carpinteiro. E agora que o lavrador partiu para estar com o carpinteiro, faz de mim também um lavrador que planta alegre a semente do Reino até o dia em que vou rever o velho lavrador na casa do carpinteiro.

Pr. Marcos Granconato
Soli Deo gloria

 

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