Sexta, 29 de Março de 2024
   
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Quais São seus Medos?

Pastoral

Em tempos de pandemia e ruptura da economia nacional, temos conhecido novas faces do medo. Pensando nisso, lembro-me de que João Crisóstomo (344-407), famoso bispo da igreja de Constantinopla, pregou o evangelho verdadeiro na capital do império e se dedicou a ensinar a santidade e a denunciar os pecados, inclusive da corte — especialmente os da imperatriz. Por isso, o imperador romano, incomodado com as constantes reprimendas e com o descontentamento da imperatriz Eudóxia, ordenou a prisão do bispo e passou a planejar seu fim. Nesse sentido, perguntou a um de seus conselheiros: “O que devo fazer com João Crisóstomo: lançá-lo em uma masmorra?”. “Não”, respondeu o conselheiro, “pois ele ficará feliz com isso. Ele anseia pela quietude na qual possa se deleitar nas misericórdias do seu Deus.” Assim, o imperador mudou o rumo do tratamento: “Então, ele deve ser executado!”. “Não”, rebateu o conselheiro, “pois ele também ficará feliz em morrer. Ele declara que, assim que morrer, estará na presença do seu Deus.” “O que devo fazer, então?”, interpelou o imperador. “Só há uma coisa que lhe causará dor”, explicou o conselheiro. “Para que João Crisóstomo sofra, faça-o pecar. Ele não teme nada, exceto o pecado.”

 

Quiséramos nós que histórias como a de João Crisóstomo ocorressem muitas vezes nos nossos dias! Essa narrativa só não se repete o tanto que deveria porque a igreja moderna tem sido ensinada que Deus é apenas amor e não justiça e santidade. Por isso, o temor de pecar tem desaparecido do meio da cristandade. No lugar dele, um número incontável de desculpas para a convivência com o pecado tem tomado o lugar da dura busca por pureza, como “Deus sabe que sou pecador”, “Deus me aceita como eu sou”, “Deus sabe que a carne é fraca”, “é no pecado que a graça de Deus se mostra”, “eu já tenho um Advogado que me defende”. Tais afirmações são verdadeiras, mas nenhuma delas deve ser manipulada a fim de aprovar o descaso com o pecado. Antes, devemos temer pecar contra o nosso Senhor e buscar, ainda que em meio a lutas, o desenvolvimento da salvação. Assim, há alguns temores que o cristão deve ter diante do pecado.

 

Em primeiro lugar, o cristão deve ter medo de não agir segundo a santidade do Criador. Pela demonstração de um poder incomparável na criação, Deus se apresenta também como um juiz supremo contra o mal. Quando ele decreta certa punição contra atos que ofendem sua santidade, não há quem possa resistir, nem há um tribunal em outra instância que possa cancelar sua sentença. Assim, o cristão deve ser reverente e servir a Deus em temor santificador: “Por isso, recebendo nós um reino inabalável, retenhamos a graça, pela qual sirvamos a Deus de modo agradável, com reverência e santo temor; porque o nosso Deus é fogo consumidor” (Hb 12.28,29).

 

Em segundo, o cristão deve temer não agir de acordo com a vontade do Salvador. O merecimento de condenação ao inferno faz com que o pecador salvo pela fé em Cristo se torne um eterno devedor da bondade e graça do Senhor. Desse modo, cumprir-lhe a vontade deixa de ser um peso para se tornar o objetivo e o desejo de todos os beneficiados pela graça salvadora. Deixar de fazer a vontade de Deus e não demonstrar gratidão pela redenção imerecida devem ser temores diários dos crentes: “Quanto a vós outros, servos, obedecei a vosso senhor segundo a carne com temor e tremor, na sinceridade do vosso coração, como a Cristo, não servindo à vista, como para agradar a homens, mas como servos de Cristo, fazendo, de coração, a vontade de Deus” (Ef 6.5,6).

 

O terceiro temor que o cristão deve ter é o de não desfrutar da comunhão com Deus. A pureza e a retidão do Senhor fazem com que o bom relacionamento diário com seus servos sofra certa alteração — não o suficiente para que haja perda de salvação, mas “perda de comunhão”: “Se dissermos que mantemos comunhão com ele e andarmos nas trevas, mentimos e não praticamos a verdade” (1Jo 1.6). Os efeitos de tal quebra é visto, então, de maneira prática e dolorosa para o povo que ele chamou, razão pela qual seus servos devem temer que o pecado afete sua comunhão com o soberano Senhor: “Eis que a mão do Senhor não está encolhida, para que não possa salvar; nem surdo o seu ouvido, para não poder ouvir. Mas as vossas iniquidades fazem separação entre vós e o vosso Deus; e os vossos pecados encobrem o seu rosto de vós, para que vos não ouça” (Is 59.1,2).

 

Finalmente, o cristão deve ter medo de não desfrutar da alegria da salvação. A quebra da comunhão diária e do bom relacionamento com o redentor eterno não traz prejuízos apenas ao bem-estar exterior e aparente dos seus servos. Em seu íntimo, há também uma ruptura da paz por causa da nova condição daquele que não foi apenas perdoado, mas também transformado. Por isso, quando o servo peca e se afasta de Deus, ele deixa de desfrutar da alegria que passou a conhecer no momento da sua conversão: “Enquanto calei os meus pecados, envelheceram os meus ossos pelos meus constantes gemidos todo o dia. Porque a tua mão pesava dia e noite sobre mim, e o meu vigor se tornou em sequidão de estio” (Sl 32.3,4).

 

Outro pai da igreja, Agostinho de Hipona (354-430), disse: “Fizeste-nos para ti e inquieto está o nosso coração enquanto não repousa em ti”. Pois que o nosso coração repouse na comunhão com o Salvador não apenas pela eterna justificação vinda da fé em Cristo, mas também pela manutenção diária do repouso amplo e experimental por meio da busca da santidade e da obediência. Que o risco de não desfrutar diariamente de tão grande bênção seja nosso maior e mais forte temor!

Pr. Thomas Tronco

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