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Obadias 9

 

“Os teus valentes ficarão aterrorizados, ó Temã, de modo que cada um será exterminado do monte de Esaú” (Obadias 9).

Ter confiança na força pessoal não é algo necessariamente ruim. Sem essa confiança em alguma medida, é muito fácil desistir diante das lutas e dificuldades da vida. Mas, em excesso, ela é um grande perigo e a porta de entrada para tragédias muitas vezes irreversíveis. E Edom sofreu também desse mal e das suas terríveis consequências.

Se o versículo 8 mencionou os sábios de Edom, os quais se sabe que se concentravam especialmente em “Temã”, cidade que, no versículo 9, é citada pelo nome e associada não aos seus sábios, mas ao exército, chamado aqui de “valentes”. Com isso, completa-se o parágrafo constituído por três severos oráculos que anunciaram a pilhagem contra os ricos (v.5-6), a perda de sabedoria e entendimento dos líderes e conselheiros (v.7-8) e a derrota do exército (v.9), tirando-lhes completamente o bem-estar econômico, o governo sábio e a segurança militar.[1]

Assim, o texto menciona “os teus valentes”. O termo original serve para descrever alguém cujas qualidades são força e vigor. Quando trata de soldados, esse termo pode ser traduzido como herói ou campeão, descrevendo um guerreiro forte e vitorioso. Ironicamente, em vez de agir como heróis ou grande guerreiros, é dito que esses soldados “ficarão aterrorizados”. O verbo hebraico utilizado pelo autor alude a um sentimento interno de dor ou pavor que destroça internamente.[2] Significa que a destruição seria tão atroz que o exército edomita seria inútil ao tentar conter os agressores e que, como resultado, o pânico tomaria conta até mesmo das tropas militares, sem falar da população indefesa como um todo.

A segunda metade do versículo contém a mesma mensagem dita de maneira semelhante, o que se chama paralelismo sinonímico. Isso quer dizer que, para fins de ênfase e se valendo de um recurso de linguagem comum na literatura hebraica antiga, o autor repete o que já disse utilizando termos paralelos, o que ele faz ao dizer que “cada um será exterminado do monte de Esaú”. Nesse caso, “cada um” equivale a “os teus valentes”; “será exterminado” equivale a “ficarão aterrorizados”; e “monte de Esaú” equivale a “Temã”.

Quando notamos tais equivalências, fica claro que, ao citar Temã, o Senhor pretende descrever o que ocorrerá a todo o país quando executar o devido juízo contra aquela nação. Esse método de descrever uma atuação geral a partir dos seus representantes notáveis é também usado, no século seguinte, pelo profeta Amós, que cita a destruição geral a partir de Temã e da capital edomita, Bozra: “Assim diz o SENHOR: Por três transgressões de Edom e por quatro, não sustarei o castigo, porque perseguiu o seu irmão à espada e baniu toda a misericórdia; e a sua ira não cessou de despedaçar, e reteve a sua indignação para sempre. Por isso, meterei fogo a Temã, fogo que consumirá os castelos de Bozra” (Am 1.11-12).[3]

Quando o texto diz que cada um “será exterminado”, isso carrega a ideia, no texto hebraico, de “ser cortado fora”, como se corta um galho de uma árvore com a finalidade de queimá-lo ou destruí-lo. É uma figura forte de um desarraigamento com a intenção de pôr fim a uma planta indesejada, promovendo a limpeza do local, ou a poda de uma árvore a fim de que ela volte a ter uma forma bonita e uma aparência agradável.

Importante notar que, tal destruição, segundo o texto, abateria “cada um” ou “cada homem”. A compreensão pode ser em dois sentidos. No primeiro, o texto pode estar se referindo a cada soldado, cada um desses valentes. No segundo sentido, uma menção mais ampla pode se referir a cada habitante de Temã. Independentemente do que o autor tinha em mente nesse caso, é fato que a morte de cada soldado seria seguida pela morte dos moradores da região, de modo que a possível menção ao extermínio dos guerreiros de Temã pode ser uma sinédoque ― uma referência de uma parte pelo todo ― para descrever que o morticínio recairia sobre toda a cidade de Temã. Do mesmo modo, é o anúncio metonímico da destruição de todas as cidades do “monte de Esaú”, ou seja, de Edom.

A mensagem do oráculo não é complicada nem difícil de entender e fecha uma descrição do abatimento nacional amplo advindo do julgamento da parte do Senhor. Entretanto, uma lição embutida no versículo 9 aborda o perigo da autoconfiança irrestrita, especialmente quando ela despreza o poder de Deus e sua justiça para punir aqueles que se portam de forma rebelde contra seus desígnios e contra seu povo.

O poder secular parece ser grande coisa quando a pessoa o atinge e se vale de seus privilégios, mas ele não pode proteger ninguém quando o Deus Todo-poderoso se levanta para emitir sentenças condenatórias contra aqueles que, por breve momento, pensaram que jamais seriam abatidos ou privados da sua capacidade de fazer tudo que querem. O correto é aprender da conclusão de Jó, que, desprovido de sua autojustiça e confiança em seus meios pessoais, declara ao Senhor: “Bem sei que tudo podes, e nenhum dos teus planos pode ser frustrado” (Jó 42.2).

Pr. Thomas Tronco


[1] Baker, David W.; Alexander, T. Desmond; Sturz, Richard J. Obadias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque e Sofonias : Introdução e Comentário. Série Cultura Bíblica. São Paulo: Vida Nova, 2006, p. 43.

[2] Schökel, Luiz Alonso. Dicionário Bíblico Hebraico-Português. São Paulo: Paulus, 1997, p. 253.

[3] Esse texto de Amós, escrito na segunda metade do século 8 a.C. (anos antes da queda de Samaria, em 722 a.C.), contendo as mesmas acusações a Edom feitas por Obadias, um século antes, enfraquece a tese de que o argumento de Obadias indicaria uma composição tardia do livro, como se a perseguição aos judeus de Jerusalém acusada no livro fosse referente à destruição de Jerusalém pela Babilônia, em 587 a.C., em vez de uma participação edomita numa desventura judaica séculos antes, como parece ter ocorrido durante o reinado de Jeorão de Judá (848-841 a.C.), quando Jerusalém viveu uma situação que se adequa ao contexto descrito pelo profeta, na qual a virada da batalha e a fuga dos judeus podem ter levado a guerra até Jerusalém (2Rs 8.20-22).

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