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Colossenses 1.3-8 - Gratidão a Deus pelos Crentes de Colossos

 

Logo após saudar a igreja de Colossos, Paulo revela que sempre agradecia a Deus por ela (3). Suas orações eram dirigidas “a Deus, o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo”. O apóstolo usa essas palavras a fim de, desde o início, fazer frente ao falso ensino que ameaçava os colossenses e que tendia a depreciar a pessoa de Cristo. Assim, ele não só realça que Jesus tem o próprio Deus por Pai (o que implica ser participante de sua natureza divina, cf. Lc 22.70-71; Jo 5.18; 19.7), mas também que ele mesmo é Senhor, enfatizando dessa forma sua singular supremacia (1Co 8.6).

O louvor dirigido por Paulo a Deus se baseava em informações que tinha recebido sobre a igreja. Ele ouvira falar que as três virtudes cristãs básicas, ou seja, a fé, o amor e a esperança (1Co 13.13; Gl 5.5-6; 1Ts 1.3; 5.8) eram patentes entre os colossenses (4-5). De fato, eles tinham fé em Cristo, o que lhes dera acesso à graça da justificação (Rm 5.1-2). Que essa fé era genuína, podia-se comprovar pelo amor que os crentes de colossos nutriam por todos os santos (Gl 5.6; 1Jo 3.10). Ademais, o que nutria e robustecia tanto a fé como o amor era a esperança celeste. Com os olhos fixos em sua herança futura os colossenses encontravam forças para permanecer fiéis a Cristo, mesmo num mundo hostil (1Tm 4.10; 1Pe 5.9-10). Também mergulhados na esperança, eles olhavam com afeição especial todos os que Deus tornara dignos de participar de um futuro tão glorioso (1.12), nutrindo, assim, amor por seus irmãos.

Deve-se ressaltar a esta altura que a esperança mencionada por Paulo não é mero otimismo vago ou a expectativa um tanto incerta de que Deus, no final, vai acolher os que têm fé. Esperança aqui é sinônimo de certeza. É algo que se espera sabendo que de fato virá (Rm 5.5; 8.20-21; Ef 1.18; Tt 1.2; Hb 6.18-19). Observe-se também que se trata de uma esperança “reservada nos céus” (1Co 15.19; 1Pe 1.4), ou seja, tem um conteúdo que representa o inverso do que preenche a esperança nutrida pelos incrédulos e pelos crentes imaturos (1Tm 6.17). Finalmente, trata-se de uma esperança que compõe a mensagem do evangelho (5 in fine). Pregar a fé cristã sem mencioná-la implica omissão de um dos seus pontos principais.

O evangelho que apresentava a esperança celeste havia alcançado Colossos, ao sul da antiga Frígia. A chegada da mensagem cristã ao vale do rio Lico mostrava que a determinação de Jesus de que sua Palavra fosse anunciada além das fronteiras da Palestina estava se cumprindo (At 1.8). E o que era mais empolgante: Paulo pôde constatar já em seus dias que esse evangelho estava se expandindo “por todo o mundo” (6).

De fato, a expansão da fé cristã ao tempo em que Paulo escreveu a Epístola aos Colossenses (61 AD) era notável. Por esse tempo o Apóstolo já tinha concluído as três viagens missionárias mencionadas em Atos. Por meio daquelas viagens, toda a parte oriental do Império Romano tinha sido alcançada pela mensagem de Cristo. Tanto isso é verdade que já em 57 AD, quando escreveu a Carta aos Romanos, o Apóstolo deu a entender que considerava cumprida sua missão no oriente e que planejava então ir à capital do império, seguindo dali para a Espanha (Rm 15.23-24).

Paulo foi preso antes de realizar esses planos e foi de sua prisão domiciliar em Roma que escreveu aos colossenses. Ao dizer agora que por todo o mundo a fé estava crescendo e frutificando, certamente mostra estar ciente de que, mesmo sem a sua cooperação, o evangelho já havia chegado também à parte oeste do império. De fato, sabe-se que a Espanha, tão visada por Paulo, acolheu o evangelho bem cedo. Ainda que não existam registros que informem como o cristianismo chegou à Península Ibérica[1], sabe-se que já no século II a igreja hispânica chamava a atenção de grandes líderes eclesiásticos como Irineu de Lyon († c. 202) e Tertuliano de Cartago († c. 220), dada a sua firmeza doutrinária e forte presença na região.[2]

Por outro lado, mesmo que o ocidente ainda não tivesse sido atingido com a pregação de Cristo quando Paulo escreveu aos colossenses, o uso da expressão “todo o mundo” não seria equivocado, pois é evidente que se trata de uma hipérbole (assim como as afirmações em 1.23 e Rm 1.8). Ora, é óbvio que a referida expressão não foi usada com o propósito de indicar especificamente cada nação ou povo que habita o globo, mas sim com o objetivo de destacar a notável expansão do cristianismo que, de uma pequena seita judaica, tornou-se religião mundial no breve período de trinta anos após o Pentecoste.

Deve-se observar aqui que Paulo não destacou o crescimento espantoso do cristianismo por amor ao sucesso ou às estatísticas. Antes, sua intenção foi certamente realçar o escopo universal do evangelho. O Apóstolo quis despertar seus leitores para o fato de que a fé cristã não era propriedade de um pequeno grupo de iniciados dotados de conhecimento especial como era o caso da doutrina ensinada pelos falsos mestres que atuavam na Frígia. Enquanto o proto-gnosticismo presente em Colossos propunha que a verdade estava nas mãos de uma minoria que alegava ter conhecimentos secretos, o evangelho era conhecido e oferecido abertamente no mundo inteiro (Rm 1.5), o que mostrava quão distante estava a fé cristã dos ensinos divulgados por aqueles que contaminavam a igreja com sua vã filosofia (2.8).

Os colossenses não precisavam percorrer o mundo para descobrir que a posse da verdade do Evangelho não era privilégio de uma minoria. Entre eles mesmos a Palavra estava frutificando e crescendo. Na própria cidade de Colossos a igreja não somente se expandia, mas também amadurecia. Como, diante de avanços tão notáveis, aqueles crentes podiam acreditar que a verdade pertencia a um grupo restrito?

Paulo informa no v. 6 que a expansão da fé vinha ocorrendo entre seus leitores desde o dia em que eles ouviram a mensagem cristã. Ele também se refere a esse tempo como o dia em que os colossenses “entenderam a graça de Deus em toda a sua verdade”. Aqui é possível perceber que a conversão consiste inclusive de um milagre no intelecto do homem alcançado pela graça. De acordo com Paulo não há quem entenda o Evangelho (Rm 3.11; 2Co 4.4; Ef 4.17-18) e a mensagem da cruz é considerada irracional pelos descrentes (1Co 1.18). Por isso, a conversão genuína sempre é acompanhada de uma capacitação especial para entender a verdade cristã básica. Essa capacitação advém da atuação sobrenatural de Deus no homem (Lc 24.45; At 16.14; 2Co 4.6-7; 1Jo 5.20).

Os colossenses entenderam a graça de Deus em toda a sua verdade.[3] Isso significa que, diferente da heresia cheia de mistérios propagada naquela região, a fé cristã tinha sido pregada ali em sua plenitude. É claro que os crentes de Colossos tinham que progredir no conhecimento espiritual das coisas que lhes haviam sido anunciadas (1.9; 2.2-3), mas tratava-se de um progresso em verdades que estavam à sua disposição desde o início, não da descoberta de segredos acessíveis somente a alguns (1.28).

Note-se que a compreensão da graça de Deus “em toda a sua verdade” também aponta para o fato de que essa graça só é realmente entendida a partir de um conjunto de lições a ela ligado. Desprezar essas lições pode levar o homem a conclusões perigosas. Aliás, os escritores do NT tiveram que lidar com problemas decorrentes da má compreensão da graça de Deus por parte de homens que, por ignorância ou deliberadamente, rejeitavam suas reais implicações (Rm 6.1-2; Gl 5.13; Jd 4). Com os colossenses não tinha sido assim. Eles entenderam plenamente o significado da graça (1Co 1.5; 1Jo 2.20). Se estavam sendo ameaçados agora por mentiras que deturpavam de algum modo o real sentido dela, precisavam apenas de uma palavra de alerta (2.4-8) e de uma exortação para que vivessem de acordo com o que já tinham aprendido (2.20-23).

Epafras fora o missionário que apresentara o Evangelho aos colossenses (7). Paulo o chama de “amado cooperador” e “fiel ministro de Cristo”. Parece que ele próprio era de Colossos e é certo que tinha profundo envolvimento com igrejas de cidades próximas, como Laodicéia e Hierápolis (4.12-13). Estando com Paulo em Roma, talvez como prisioneiro também (Fm 23), ele relatou ao Apóstolo o progresso dos colossenses, falando-lhe do amor que eles tinham no Espírito (8).

O amor “no Espírito” de que fala Paulo no v. 8 é a disposição de promover o bem do outro mesmo quando isso requer alguma dose de esforço ou implique algum grau de prejuízo.  É chamado de amor “no Espírito” porque o Espírito Santo é a sua fonte (Gl 5.22). Por isso, somente as pessoas que estão dentro da esfera de atuação especial do Espírito de Deus podem desenvolver um amor assim. Além dessas fronteiras, o homem vive “na carne”, sendo movido pelo amor de si mesmo e por suas vergonhosas inclinações naturais (Gl 5.19-21). Aliás, esse era o caso dos falsos mestres que atuavam em Colossos (2.23).

Pr. Marcos Granconato



[1] Há tradições que ligam a origem do cristianismo na Espanha ao ministério de Paulo realizado depois de sua primeira prisão em Roma. Há também a lenda de que o evangelho chegou à península através de sete missionários enviados por Pedro. A história mais popular atribui a chegada da fé cristã à Espanha ao Apóstolo Tiago que, antes de ser morto por Herodes em Jerusalém, teria visitado a região e pregado na Galícia e em Zaragoza. Depois de sua morte, seus restos mortais teriam sido supostamente levados para a Espanha, onde agora repousam na basílica de Santiago de Compostela. Nenhuma dessas histórias, porém, são dotadas de embasamento histórico. Veja-se Justo Gonzalez. Uma história ilustrada do cristianismo. 10 vols. A Era dos Mártires, vol. 1. São Paulo: Vida Nova, 1980. p. 42-44.

[2] Veja-se Boanerges Ribeiro. A igreja na Península Hispânica antes de Constantino. In: Fides Reformata 1:2 (jul/dez). São Paulo: JURET, 1996. p. 71.

[3] A NVI traduz dessa forma para resguardar o sentido do verbo grego que é “conhecer exata e completamente”. Evidentemente, ao usar esse verbo, Paulo contraria o ensino do gnosticismo nascente, cujos mestres se gabavam de ser detentores de conhecimentos ocultos. A forma substantiva encontra-se em 1.9,10 e 3.10.

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