Sexta, 19 de Abril de 2024
   
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Salmo 112 - A Alegria de Ser um Homem que Teme a Deus

 

Em 1975, Carl Hubbs, de 81 anos na época, professor emérito de Biologia do Instituto de Oceanografia Scripps de San Diego (EUA) – um dos maiores, mais antigos e mais importantes centros de pesquisa marinha do mundo –, foi aplaudido longamente ao receber o Prêmio Headliner oferecido pelo San Diego Press Club. O interessante na premiação foram as palavras do professor ao ser condecorado: “Eu realmente não sei por que estou recebendo isso. Tudo que eu sempre fiz foi exatamente aquilo que eu queria fazer”. O que ele quis dizer é que não era mérito alguém ser ou fazer aquilo de que gosta. O prêmio já está em sê-lo ou fazê-lo. Contudo, a plateia deve ter discordado ao relembrar as contribuições que aquele homem havia feito para o conhecimento científico e para a melhoria da vida das pessoas. Eles até podiam concordar que ele viveu como alguém realizado por cumprir seus desejos e objetivos, mas, dado o valor do seu legado, merecia também o reconhecimento público.

O Salmo 112 não difere muito de alguns princípios dessa história. O salmista anônimo olha para a vida dos servos de Deus que buscam e se alegram com suas palavras. Apesar de receberem títulos honrosos como “homem que teme ao Senhor” (v.1) e “retos” (v.2) – o que em si mesmo é a melhor posição que um homem pode ter diante do criador e sustentador do universo –, eles ainda recebem bênçãos suplementares de Deus por lhe pertencer. É como se eles fossem premiados com uma medalha por terem recebido outra medalha. É bênção em decorrência de outra bênção. Por isso, o salmista olha para os abençoados servos de Deus e lhes aponta benefícios temporais que recebem de Deus, os quais emolduram as bênçãos eternas que lhes foram prometidas e garantidas, e o modo como eles mesmos são veículos de bênçãos para as pessoas ao seu redor. Segundo o autor, pelo menos quatro realidades temporais estão presentes nas vidas dos tementes.

A primeira realidade temporal ligada ao homem que teme a Deus é que ele é alvo de muitas bênçãos (vv.1,2). Assim como no salmo precedente, há uma exaltação a Deus. Ela é seguida pela afirmação da bem-aventurança vantajosa ligada aos servos de Deus (v.1): “Exaltai ao Senhor! Feliz é o homem que teme ao Senhor, o qual se compraz intensamente em seus mandamentos” (hallû yah ’ashrê-’îsh yare’ ’et-yhwh bemitsôtayw hafets me’od). Deve-se notar que, para o Israel dos dias do salmista, havia uma dupla fonte de felicidade ao temer a Deus e obedecer à sua lei. Em primeiro lugar, a sabedoria e santidade dos preceitos divinos visavam a colocar os israelitas em comunhão com o Senhor e em pleno desfrute desse relacionamento. Em segundo lugar, havia promessas específicas de bênçãos pela obediência à aliança que garantiriam o bem-estar do povo na terra da promessa (Lv 26.3-13; Dt 28.1-14). Assim, não é sem razão que os homens que se adequavam à esperada submissão a Deus e à obediência aos mandamentos podiam ser chamados de “felizes”. Já que no mundo antigo uma das maiores marcas de alguém feliz e repleto de bênçãos era uma posteridade numerosa e duradoura, o salmista apresenta esse benefício como bênção de Deus concedida aos seus servos tementes (v.2): “A sua descendência será poderosa na Terra. A geração dos retos será abençoada” (givvôr ba’arets yihyeh zar‘ô dôr yesharîm yevorak).

A segunda realidade temporal é que ele impacta sua comunidade (vv.3-6). O homem que teme a Deus não é apenas alvo de bênçãos divinas, mas também um veículo de bênçãos para sua comunidade. Por isso, o salmista descreve as bênçãos dos justos previstas na aliança lado a lado com seu caráter justo que as administra (v.3): “Na sua casa há prosperidade e abundância e a sua justiça permanece perpetuamente” (hôn-wa‘osher bevêtô wetsidqatô ‘omedet la‘ad). Sendo assim, não há riscos de ele usar os bens que Deus lhe concedeu para fazer o mal ou para sobrepujar e explorar seus colegas. Em lugar disso, ele age com justiça. Ao fazê-lo, ele se torna um exemplo em sua comunidade (v.4): “Na escuridão ele brilha uma luz para os retos, [sendo] benigno, compassivo e justo” (zarah bahoshek ’ôr laysharîm hannûn werahûm wetsaddîq). Esse texto aponta para a generosidade do servo de Deus no uso dos seus bens (cf. v.5), de modo que se torna uma luz que brilha sobre o caminho a ser seguido por outras pessoas que possuem o mesmo caráter.

O resultado prático da sua generosidade surge quando ele, compadecido da situação difícil de outras pessoas, lhes socorre com o necessário (v.5a): “Bom é o homem que se compadece e que empresta.” (tôv-’îsh hônen ûmalweh). E essa não é uma bondade somente aparente que esconde intenções questionáveis e gananciosas, pois ele não se aproveita dessa situação para se beneficiar com explorações (vv.5b,6a): “Ele administra seus negócios com integridade, de modo que nunca será abalado” (yekalkel devarayw bemishpat kî-le‘ôlam lo’-yimmôt). Esse tipo de homem é também descrito em outro lugar como “o que não empresta o seu dinheiro com usura, nem aceita suborno contra o inocente. Quem deste modo procede não será jamais abalado” (Sl 15.5). O impacto positivo da vida do servo de Deus em sua comunidade é descrito no fato de que ele é lembrado pelas pessoas com saudades e como um exemplo a ser seguido (v.6b): “Sempre haverá recordação do justo” (lezeker ‘ôlam yihyeh tsaddîq).

A terceira realidade é que ele não teme os revezes (vv.7,8). Isso não quer dizer que se trate de alguém inconsequente e irresponsável. Sua coragem também não vem de uma confiança desmedida em sua própria capacidade. Em lugar disso, seu relacionamento com Deus, guiado pelas Escrituras, lhe confere confiança em seu Senhor soberano (v.7): “Ele não tem medo de notícias ruins. Seu coração está firmado, confiado no Senhor” (mishemû‘â ra‘â lo’ yiyra’ nakôn livvô batuah bayhwh). Outra possível tradução para a palavra “firmado” é “preparado”, transmitindo a ideia de que o servo que conhece bem a Deus está preparado para enfrentar revezes, pois sabe que nenhum deles é maior que o Senhor e que Deus não tem qualquer dificuldade de efetuar o que decide fazer (Jó 42.2). Por isso, sua confiança e falta de temor não vêm de arrogância pessoal ou de inconsequência, mas do ensino bíblico sobre quem Deus é e como ele age para com os que lhe pertencem. Conhecendo tais realidades, seu coração continua firme até o final das lutas (v.8): “Seu coração é estável. Ele não tem medo até que veja seus inimigos [derrotados]” (samûk livvô lo’ yiyra’ ‘ad ’asher-yir’eh betsarayw). O uso da preposição “até” não sugere que depois de certo tempo ele passa a ter medo, mas que ele confia em Deus durante “todo” o processo de lidar com o perigo e que, em decorrência disso, não dá espaço ao temor.

A última realidade temporal ligada ao homem que teme a Deus é que ele contrasta com os ímpios (vv.9,10). Antes de concluir o salmo, o escritor faz um resumo das qualidades já expostas do homem que teme a Deus. Em primeiro lugar, ele é generoso (v.9): “Ele reparte [o que tem], dá aos necessitados” (pizzar natan la’evyônîm). Sua justiça é perene, não mudando conforme as circunstâncias: “Sua justiça permanece perpetuamente” (tsidqatô ‘omedet la‘ad). E seu progresso se dá em conformidade com a honestidade e a respeitabilidade: “Seu poder se elevará honrosamente” (qarnô tarûm bekavôd). Esse é um quadro muito bonito. Entretanto, tal beleza tem a capacidade de tornar ainda mais horrível o estado dos homens maus. Quando colocados lado a lado com os tementes servos de Deus, os ímpios têm seus pecados e falhas de caráter postos em relevo. Esse contraste causa neles um extremo desconforto (v.10): “O ímpio vê [isso] e se enfurece, range seus dentes e desfalece. O desejo dos ímpios perecerá” (rasha‘ yir’eh weka‘as shinnayw yaharoq wenamas ta’awat resha‘îm to’ved). A razão de tal contraste é exposta pelo apóstolo que, ao citar os feitos indignos dos ímpios (Ef 5.12), afirma sua evidenciação diante da exposição do bem: “Mas todas as coisas, quando reprovadas pela luz, se tornam manifestas; porque tudo que se manifesta é luz” (Ef 5.13).

Desde a época em que o salmo foi escrito, a realidade dos servos de Deus não mudou. Eles continuam abençoados por Deus – ainda que não mediante as cláusulas específicas da aliança mosaica: “Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos tem abençoado com toda sorte de bênção espiritual nas regiões celestiais em Cristo” (Ef 1.3). Têm a responsabilidade de impactar a sociedade com os ensinos de Cristo: “Vós sois o sal da Terra; ora, se o sal vier a ser insípido, como lhe restaurar o sabor? Para nada mais presta senão para, lançado fora, ser pisado pelos homens. Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder a cidade edificada sobre um monte” (Mt 5.13,14). Têm motivos bíblicos para manter plena confiança em Deus nos momentos difíceis: “E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século” (Mt 28.20b). E são chamados a viver de modo contrário ao mundanismo presente: “No sentido de que, quanto ao trato passado, vos despojeis do velho homem, que se corrompe segundo as concupiscências do engano, e vos renoveis no espírito do vosso entendimento, e vos revistais do novo homem, criado segundo Deus, em justiça e retidão procedentes da verdade” (Ef 4.22-24). Com isso em mente, que este salmo seja a realidade diária da nossa vida, servos que temem a Deus!

Pr. Thomas Tronco

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