Quinta, 25 de Abril de 2024
   
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Salmo 93 - A Majestade do Grande Rei

 

uma história que pregadores e escritores ao redor do mundo não se cansam de repetir. É a respeito da visita de certo cavalheiro, Sir Leonard Wood, ao rei da França. Segundo contam, o monarca ficou tão feliz com a amável visita que convidou Sir Leonard para jantar com ele no dia seguinte. Quando o convidado chegou ao compromisso no outro dia, o rei, surpreso por vê-lo ali, disse-lhe: “Sir Leonard, eu não esperava vê-lo. Como aconteceu de você vir?”. Atônito, o convidado respondeu: “Vossa majestade não me convidou para jantar convosco?”. “Sim, convidei”, disse o rei, “mas você não confirmou que aceitou o convite”. Nesse momento, Sir Leonard Wood disse algo de muito efeito: “Um convite de um rei nunca é para ser confirmado, mas para ser obedecido”. Por essa frase é possível perceber que o cavalheiro tinha perfeita consciência do significado da majestade e das prerrogativas ligadas a um rei.

O Salmo 93 foi escrito por alguém que tinha essa mesma consciência, porém, em uma escala muito maior. Ele, um escritor anônimo, viveu na época em que reinavam muitos monarcas sobre as muitas nações. Contudo, ele olha para um rei em especial e vê nele as máximas qualidades que os reis deveriam ter, por meio das quais inspiraria em seus súditos a obediência e lhes faria imitar seu senhor no que tange à honra, à verdade e ao amor. Infelizmente, poucos reis na história marcaram seus súditos de um modo assim tão positivo. Mas o rei que o salmista tem em mente porta qualidades inigualáveis que o tornam um soberano singular, digno de ser servido e honrado, querido e amado, benquisto e adorado. Esse soberano, cuja majestade é única, é o Senhor Deus. A ele o salmo é dirigido, o qual evidencia, no decorrer do texto, quatro qualidades do Rei do reis. 

A primeira qualidade descrita no salmo é a majestade de Deus (v.1). Logo de início fica patente o seu múnus real: “O Senhor reina” (yehwâ malak). O texto não se preocupa em dizer sobre quem ele reina – parece que o salmista considera essa uma questão óbvia. Essa breve afirmação traz implícito que Deus é o monarca de tudo que existe, sobre tudo que criou. E mais que isso: se preocupa em colocá-lo, ao descrevê-lo como rei, no topo de uma hierarquia de comando, de poder e de respeito. Essa figura – o rei – deve ser adicionada a várias outras presentes no livro de Salmos usadas para descrever Deus, tais como “pastor” (Sl 23.1), “pai” (Sl 89.26) “alto refúgio” (Sl 59.9), “abrigo forte” (Sl 71.7), “socorro” (Sl 70.5) e “proteção” (Sl 63.7). Usar tais figuras sem enfatizar a majestade de Deus pode produzir a impressão de que ele é servo dos homens – essa é uma visão muito comum que se tem de Deus na atualidade. Mas, ao dizer que ele reina, é exposta a verdade de que ele é quem deve ser servido por nós, enquanto graciosa e voluntariamente abençoa-nos como seus súditos.

O salmista explora um pouco mais a figura real trazendo à mente dos leitores as vestes de um rei. O mundo antigo conhecia a prática de os reis trajarem “vestes reais” que, além de serem feitas com os melhores e mais caros tecidos e ornamentos, transmitiam a ideia da realeza (Et 6.8; Jn 3.6). Nesse caso, a roupa do Senhor, com a qual se reveste, é sua própria majestade: “Ele vestiu a majestade” (ge’ût lavesh). Ser majestoso, além de inspirar respeito, reverência e obediência, significa ter capacidade de exercer domínio: “O Senhor vestiu a força, [com ela] se cingiu” (lavesh yehwâ ‘oz hit’azzar). A palavra “cingir”, que descreve uma das preparações para uma batalha, também por ser traduzida como “se armar”. Desse modo, o rei é alguém com poder e capacidade de guerrear e, por isso, é temido e governa sobre outros. Os resultados práticos desse traço da majestade de Deus são o perfeito controle da sua criação e o comando de tudo que acontece na história: “O mundo certamente está firmado, ele não se abala” (’af-tikkôn tevel bal-timmôt). Deus é um rei de direito e de fato.

A segunda qualidade alistada é a eternidade de Deus (v.2). O rei do universo não é majestoso só porque ele quer ser ou porque disse ser. Ele possui qualidades intrínsecas que o separam de todo o restante, tornando-o singular. Aliás, não apenas o separa da criação como o coloca muito acima dela. Uma dessas qualidades singulares está ligada à sua existência. Dando sequência ao assunto relativo ao caráter real de Deus, diz o escritor: “O teu trono está estabelecido desde a Antiguidade” (nakôn kis’aka me’az). A conclusão é clara: desde os tempos mais remotos da história, ou seja, desde a criação de tudo que existe, Deus é o rei majestoso da humanidade, do mundo e de todo universo. Entretanto, o salmista não para por aí. Parece que ele não quer deixar espaço para uma visão de que Deus tem a mesma idade do universo, como se tivesse sido criado com ele. O salmista alonga a existência de Deus para antes da criação sem permitir que a ele seja atribuído um dia de nascimento. Para o salmista, Deus existe desde sempre, sem começo e sem origem: “Tu és desde a eternidade” (me‘ôlam ’attâ). Essa realidade certamente multiplica a contemplação da majestade divina de modo incalculável.

A terceira é o poder de Deus (vv.3,4). Se o ponto anterior lida com conceitos que vão além da compreensão e da observação humana – eternidade e autoexistência –, algo palpável ao homem é reconhecer a majestade de um rei por meio do seu poder. No campo político, quanto maiores eram os exércitos de um rei, suas muralhas e seu domínio, maior era a majestade do seu reinado. No campo teológico, não é diferente. O poder de Deus confere a ele o reconhecimento nítido, por parte do homem, da sua posição de rei soberano. Pensando nisso, o salmista introduz o assunto citando uma das maiores forças da natureza (v.3): “Os rios levantam, ó Senhor, os rios levantam a sua voz, os rios levantam o seu estrondo” (nas’û neharôt yhwh nas’û neharôt qôlam nas’û neharôt dokyam). O ato de “o rio levantar sua voz” é uma figura de linguagem – personificação – que pretende apontar para o barulho das fortes corredeiras de água. Apesar disso, o escritor não está meditando sobre a natureza. Ele está fazendo referência a uma das suas forças mais poderosas para servir de base de comparação com o poder de Deus.

Sua intenção, ao fazer isso, fica clara quando ele antepõe a força das águas ao poder de Deus (v.4): “Mais poderoso que o barulho das águas caudalosas, mais poderoso que as ondas do mar é o Senhor nas alturas” (miqqolôt mayim ravvîm ’addîrîm mishberê-yam ’addîr bammarôm yhwh). Se lembrarmos que nessa época não havia a infraestrutura que temos hoje como pontes, diques e muros de contenção fluvial, perceberemos que as forças das águas eram um problema sério para quem precisava atravessar um rio, de modo que era algo arriscado e que nem sempre era possível realizar (1Sm 30.9,10). Se recordamos, também, que as embarcações da época não passavam de “barquinhos” de madeira muitíssimo inferiores os navios atuais – mesmo esses sofrem com as forças das águas do oceano e por vezes afundam –, podemos imaginar que tipo de ameaça representavam as ondas do mar nos dias do salmista. Sabendo que era assim que os homens encaravam as correntes de águas, muito mais poder eles deviam reconhecer em Deus e, por isso, temê-lo como grande rei.

A última qualidade do Rei dos reis, conforme exposto no salmo, é o caráter de Deus (v.5). Como a ideia da majestade não abrange apenas a grandeza de um rei, mas traços que o tornam “admirável” à vista dos observadores, seu caráter colabora para a figura do rei majestoso. Duas qualidades que todo rei deveria ter e que Deus as tem em escala máxima são a “fidelidade” e a “santidade”: “Os teus preceitos são fidelíssimos. A santidade é própria à tua casa para sempre, ó Senhor” (‘edoteyka ne’emnû me’od levêteka na’awâ-qodesh yhwh le’orek yamîm). A palavra de um rei deveria ser tão respeitável e verdadeira quanto a realeza do monarca. No caso de Deus isso é mais que verdade. Assim, como alguém fiel, seus testemunhos e orientações são confiáveis tanto no sentido de promover verdadeira sabedoria e bem-estar naqueles que os seguem como no sentido de conferir firme esperança de que Deus cumprirá todos as promessas que fez. Já, como alguém santo, todo o erro, engano e maldade estão distante dele. É extremante benéfico ser súdito de um rei santo, pois o governo desse soberano será marcado pela qualidade que anda de mãos dadas com a santidade: a justiça. Esse governo santo também terá como característica incentivar seus vassalos, pela imitação, a viver em santidade. Por fim, a santidade desse rei eterno não apenas nos leva a servi-lo, como nos impulsiona à verdadeira adoração.

Que visão magnífica da majestade do nosso Deus. A monarquia é em si notável, visto no fato de que reis, rainhas, príncipes e princesas sempre chamam a atenção do mundo, mesmo daqueles que nem são seus súditos. Isso é assim porque a realeza tem algo de admirável. Porém, quando o monarca é um Deus majestoso em todos os sentidos, eterno, onipotente, fiel e santo, nossa admiração se transforma em louvor e adoração. Que estão fazendo os homens, então, que não se curvam diariamente diante do seu trono de glória, nem lhe rendem sua obediência, sua reverência e seu amor?

Pr. Thomas Tronco

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