Sexta, 29 de Março de 2024
   
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Igrejas Pós-modernas

Pós-modernidade é a expressão usada para descrever os últimos trinta ou quarenta anos, fase em que o homem ocidental desistiu da busca racional da verdade, afirmando que ela é múltipla e subjetiva. Segundo a visão pós-moderna, cada indivíduo tem a sua verdade particular, sendo todas as concepções existentes igualmente válidas e dignas do respeito de todos. 

A visão pós-moderna invadiu a igreja de maneira que até mesmo as denominações históricas foram contaminadas deixando de lado a firme defesa da verdade única do evangelho e dando espaço para uma “mente mais aberta”, contrária às concepções cristãs sólidas, agora taxadas de “fundamentalistas” ou “radicais”.

Basicamente, as igrejas pós-modernas apresentam quatro traços distintivos: hermenêutica relativista, discurso conciliador, ênfase excessiva na liberdade humana e afrouxamento ético/moral.

No tocante ao primeiro traço, a hermenêutica relativista, este se refere ao fato de que o púlpito pós-moderno não se preocupa com a busca de um significado fixo no texto bíblico. Os pregadores que atuam nessas igrejas não se empenham na tentativa de descobrir a intenção autoral quando trabalham sobre uma determinada porção das Escrituras. Antes, crendo que a verdade é múltipla, atribuem ao texto sagrado o sentido que acham melhor ou mais conveniente. A pregação pós-moderna é, assim, mais uma exposição de percepções e insights pessoais do pregador do que uma apresentação objetiva do que a Bíblia realmente diz, com suas inevitáveis implicações e aplicações para a vida das pessoas.

Essa leitura subjetiva da Bíblia não fica, contudo, limitada ao púlpito das igrejas pós-modernas. Seus membros também a praticam. Por isso, é comum ouvir-se indivíduos que pertencem a essas comunidades dizendo: “Essa passagem tem várias interpretações” ou, quando são confrontados à luz da Bíblia, por causa de algum erro que cometem, evadirem-se, afirmando: “Desculpe, essa é a sua interpretação dessa passagem. Eu entendo esse texto de forma diferente.”

Conforme se vê, a hermenêutica adotada nas igrejas pós-modernas esvazia a Bíblia de sua autoridade. Atribuindo ao texto sagrado um universo infinito de sentidos, a Bíblia se torna, para essa nova classe de cristãos, um livro inútil para ensinar, repreender, corrigir e educar na justiça (2Tm 3.16).  Além disso, sob a óptica de que a Bíblia tem múltiplos sentidos, todos igualmente aceitáveis, qualquer crente sincero que tentar “impor” a compreensão natural do texto a outro membro da igreja, tentando admoestá-lo como irmão, é, imediatamente, visto como orgulhoso, como alguém que pensa que só a visão dele é a certa, ou como pessoa que não tem o fruto do Espírito, pois não ama até o ponto de respeitar o ponto de vista do outro.

Assim, quem quiser obter a simpatia dos membros das igrejas pós-modernas deve ser “politicamente correto”, jamais se manifestando contra o modo muitas vezes absurdo como os outros compreendem as questões tratadas na Palavra de Deus.

Isso conduz ao segundo traço das igrejas pós-modernas: o discurso conciliador. Não havendo uma verdade fixa, ou somente um sentido nos escritos bíblicos, qualquer forma de religião ou de espiritualidade deve ser considerada válida, segundo o pensamento dos crentes pós-modernos. Portanto, o caráter exclusivo do cristianismo, a forma como sempre se apresentou na história como o singular detentor da única mensagem que pode salvar o homem (Jo 14.6; At 4.12; Ef 4.4-5; e 1Tm 2.5) é totalmente desprezado no discurso evangélico pós-moderno. 

Como resultado, as igrejas que adotaram essas noções jamais denunciam os erros doutrinários propostos pelo espiritismo, pelas religiões orientais ou pelas seitas pseudocristãs. Na verdade, é mais fácil (e mais comum!) atacarem crentes convictos, acusando-os de terem visão estreita e radical, do que reprovarem os falsos credos.

Note bem: não é que os cristãos pós-modernos concordam com as doutrinas espíritas ou com os ensinos das seitas ou mesmo com as lições das religiões orientais. O que ocorre é que, para eles, concordar ou não com essas doutrinas (ou com qualquer outra) é irrelevante. Segundo os pastores e membros dessas igrejas, o que deve ser levado em conta na avaliação dos diferentes credos é que todos, supostamente, perseguem os ideais supremos de construir uma sociedade com menos sofrimento e de oferecer paz e consolo ao triste coração humano. De acordo com o discurso cristão pós-moderno, só isso é relevante, sendo precisamente nesse ponto que qualquer forma de espiritualidade ou de religiosidade se iguala ao cristianismo, tanto em importância como em validade.

O fato de as religiões em geral terem cosmovisões ou sistemas doutrinários diferentes do que é ensinado na Bíblia é, pois, assunto secundário para a nova mentalidade cristã; um detalhe sem importância, já que, não havendo verdade fixa, o essencial é a sinceridade de cada um na adoção de suas crenças, a busca (comum a todas elas) por um mundo melhor e a tolerância com quem pensa diferente.

Por isso, o pensamento cristão pós-moderno é tão conciliador. Nele não há espaço (e nem motivo) para o discurso bíblico que condena o erro, opõe-se ao desvio e denuncia a mentira. O homem pós-moderno não entende que agir assim faz parte do dever cristão (Mt 22.29; 2Co 10.5; Gl 3.1-3; 2Tm 2.25-26). Para ele, o crente zeloso que exorta e corrige é soberbo e sem amor.

O terceiro traço das igrejas pós-modernas, o afrouxamento ético/moral, é consequência lógica tanto da hermenêutica subjetiva como do discurso conciliador. Com efeito, atribuindo à Bíblia uma variedade ilimitada de sentidos, o cristão pós-moderno, em situações que exigem a tomada de decisões no campo moral, fatalmente escolherá a interpretação mais cômoda, que melhor se ajuste aos seus interesses pessoais. Ademais, adotando um discurso conciliador embasado na crença de que a verdade não é única, o novo cristão aplicará essa forma de pensar também às questões éticas, dizendo que não se podem condenar as opções de comportamento de ninguém.

Unindo isso tudo, o resultado é previsível e óbvio: as igrejas pós-modernas, invariavelmente, revelam posicionamentos muito frouxos em relação a temas como namoro misto, sexo fora do casamento, divórcio, homossexualismo, envolvimento do cristão com o mundo e uso de álcool, cigarro ou mesmo drogas. Em decorrência dessa frouxidão, os membros das igrejas pós-modernas que adotam posturas claramente antibíblicas acerca dos temas mencionados ou de outros assuntos ligados à ética cristã não recebem qualquer correção. Na verdade, nada diferente poderia ser esperado, pois, como já dito, na visão pós-moderna, dizer o que é errado é errado!

Cabe aqui uma observação importante: o fato de as igrejas pós-modernas apresentarem tão nítida frouxidão ético/moral talvez seja a causa do seu espantoso crescimento. Multidões lotam seus salões na busca não de correção, mas de qualquer discurso que gere conforto e bem-estar, longe do incômodo produzido pela pregação da pura Palavra de Deus, capaz de ferir as consciências e infundir arrependimento. É que, conforme disse o profeta Jeremias, “a palavra do Senhor é para eles desprezível, não encontram nela motivo de prazer” (Jr 6.10). Além disso, sabe-se que é próprio da natureza humana corrupta cercar-se de mestres que não se opõem às suas paixões (2Tm 4:3).

O último traço do evangelicalismo pós-moderno é a ênfase excessiva dada à liberdade humana. Nesse modelo, o crente não é apenas livre para interpretar a Bíblia como quiser e, consequentemente, adotar o modelo ético que quiser. Sua liberdade vai além. Mais do que ser dono de suas verdades e dos seus caminhos, o cristão pós-moderno considera-se também dono do seu destino!

Ocorre o seguinte: a mente pós-moderna tem dificuldades para aceitar a presciência de Deus ensinada na Bíblia (Is 46.8-10; Jo 21.18-19), pois, se Deus conhece de antemão o amanhã, então, o futuro é fixo e o homem, no fim das contas, não é livre. Esse dilema é real para qualquer cristão, estando sua solução escondida na mente insondável de Deus, verdade que deve ser suficiente para aquietar qualquer questionamento (Rm 9.19-20). Diante dessa dificuldade, porém, o crente pós-moderno não passa apertos. No afã de resguardar o ser humano, resolve tudo dizendo simplesmente que Deus não conhece o futuro, estando o porvir aberto à influência do homem que pode escrevê-lo a partir do livre exercício de sua vontade. Essa concepção de Deus e suas relações com o mundo é uma das características do modelo teológico denominado Teísmo Aberto.

Percebe-se assim, que a hipervalorização da vontade livre do indivíduo é a mola mestra do pensamento cristão pós-moderno. Conforme visto, a partir de suas concepções, o crente é livre para atribuir às Escrituras o sentido que quiser; é livre para construir a ética que quiser e é livre para dirigir a história como quiser. Trata-se do império do indivíduo cuja abrangência chega ao ponto de destronar o próprio Deus a fim de preservar a supremacia da liberdade humana.

No fim das contas, o impacto mais desastroso dessa mentalidade sobre a Sã Doutrina é a criação de um deus impotente e ignorante, que lamenta as desventuras da raça humana, mas que pouco pode fazer, já que a administração da história depende também do homem e qualquer interferência divina soberana implicaria imposição de vontade, tornando Deus culpado por não agir de modo “policamente correto”.  Não restam dúvidas, pois, de que o deus do cristianismo pós-moderno não é o Deus das Escrituras. Trata-se de outro deus, com tremendas limitações. É lamentável, mas o que se deduz da análise desses conceitos é que criou, pois, o Homem um deus à sua própria imagem, à imagem do Homem o criou...  

Pr. Marcos Granconato
Soli Deo gloria
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