Quinta, 28 de Março de 2024
   
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O Contraste entre Dois Pactos

Pastoral

“Ora, o mediador não é de um, mas Deus é um” (Gl 3.20).

O versículo acima mostra o quanto um texto do NT, quando traduzido ao pé da letra, pode ser lacônico e vago. Trata-se, também, de um versículo que ilustra a importância do contexto como ferramenta crucial na compreensão de determinada passagem.

De fato, ao dizer simplesmente que “o mediador não é de um” e que Deus, porém, “é um”, Paulo não transmite uma ideia clara ou completa ao leitor atual e, caso alguém caia na tentação de buscar o significado dessas afirmações à parte do assunto tratado pelo apóstolo, o máximo a que talvez seja capaz de chegar abrangerá uma defesa do monoteísmo, frisando a parte final do versículo e dizendo que há um só Deus e nenhum outro.

Ao escrever Gálatas 3.20, porém, Paulo não se propôs a defender o monoteísmo como, numa leitura desatenta, pode parecer. O monoteísmo, obviamente, é verdadeiro e Paulo o ensina claramente em outros escritos (Ex.:1Co 8.5-6; 1Tm 2.5). Porém, não é esse o tema de que ele trata aqui e a simples observação do contexto deixa isso fora de dúvida.

A verdade é que, quando levado em conta o assunto de que Paulo trata nessa porção da Carta aos Gálatas (vejam-se os vv.15-19), fica evidente que, no v.20, o apóstolo está propondo um contraste entre a aliança promulgada ao tempo de Moisés (que envolvia a Lei) e o pacto de Deus firmado com Abraão.

Assim, quando Paulo afirma que “o mediador não é de um”, ele está se referindo a Moisés e à aliança que veio à luz por sua instrumentalidade. Nessa aliança, Moisés atuou como um “mediador”, o que evidenciava a bilateralidade (“não é de um”) do Pacto do Sinai. Sendo, pois, bilateral, a Aliança Mosaica comprometia ambas as partes (Deus e o povo), impondo sobre as duas tanto direitos como obrigações. Frise-se que, no pensamento de Paulo, a simples existência de um mediador era prova cabal de que a Aliança Mosaica era bilateral, comprometendo tanto Deus como os homens.

O versículo, porém, prossegue e Paulo apresenta o segundo elemento do contraste que quer estabelecer. Que esse contraste existe, fica evidente pelo uso que faz da conjunção δέ (mas). O apóstolo, assim, afirma: “Mas Deus é um”. Em outras palavras: se, de um lado, houve um pacto em que duas partes se obrigaram (a Aliança Mosaica); de outro, houve um pacto no qual somente um se obrigou, isto é, Deus. Com efeito, no Pacto Abraâmico “Deus é um”, isto é, figura como a única parte que se comprometeu, fixando, dessa forma, uma aliança unilateral.

Observe-se, portanto, que o sentido da frase “Deus é um” (que, a princípio, parece tão desconectada do assunto), pode ser claramente detectado à luz do ambiente textual em que ela se encontra. Esse ambiente mostra que a expressão “mas Deus é um” se relaciona com o pacto de Deus com Abraão (vv.16,19), sendo, a partir desse aspecto presente no texto, que a frase em pauta deve ser entendida.

Resumindo: em Gálatas 3.20, Paulo ensina que, diferente da Aliança Mosaica, a Aliança Abraâmica envolveu somente um: Deus. Isso significa que, ao fazer suas promessas ao velho patriarca, somente Javé se comprometeu, o que, aliás, pode ser facilmente observado no fato de somente ele ter passado entre os pedaços de animais que foram mortos para formalizar aquela aliança (Gn 15.17).

Qual é a relevância desse ensino? Muito simples: Paulo destaca que as bênçãos da promessa estão ligadas à Aliança Abraâmica e não à Aliança Mosaica (v.16-17). E a Aliança Abraâmica, diferente da Mosaica, é unilateral, não impondo norma nenhuma ao homem. Consequentemente, para participar das bênçãos da Aliança Abraâmica, não é preciso observar regra alguma (como os galateus estavam fazendo), mas somente crer (como Abraão fez — vejam-se os vv.22,24).

Infelizmente, muitos evangélicos de hoje acreditam que a herança da promessa está conectada à Aliança Mosaica e vivem cumprindo regras (até mesmo não bíblicas) para alcançá-la. Quão felizes seriam, porém, se descobrissem o verdadeiro evangelho e, finalmente, aprendessem que a herança de Deus se conecta ao Pacto Abraâmico — um pacto unilateral, livre de preceitos e normas; enfim, um pacto que beneficia os que tão somente creem em Cristo, tornando-os, afinal, herdeiros do universo.

Pr. Marcos Granconato

Soli Deo gloria

 

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