Quinta, 28 de Março de 2024
   
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Escatologia: Um Tema Esquecido

Pastoral

O primeiro homem de Deus que tive o privilégio de ter como pastor se chamava João Korps. Apesar de ser criança naquela época, lembro-me ainda dele com seu terno e gravata pretos, chegando à minha casa para visitar a família e ler um pedacinho da Bíblia com a gente.

O saudoso Pr. Korps não era conhecido apenas por suas visitas breves e simpáticas, mas também pelas palestras que apresentava e pelos livros que escrevia sobre escatologia. Eu me recordo que quando ele ia a alguma igreja para expor seus estudos, o local ficava cheio de gente, todos interessados na doutrina das últimas coisas.

Curiosamente, nos dias atuais, aquele velho interesse pelo ensino bíblico sobre o futuro parece ter se esfriado. O que será que aconteceu? Pessoalmente, acredito que o desinteresse atual pela escatologia tem, pelo menos, três motivos.

Em primeiro lugar, o descaso pelas doutrinas acerca do fim tem razões ligadas às circunstâncias da época em que vivemos. Ao longo da história, é notável que algumas doutrinas receberam atenção maior por parte dos teólogos e da igreja como um todo em virtude de fatores externos que estimularam o debate. Nos séculos 4 e 5, por exemplo, os temas preferidos eram Trindade e cristologia. Já nos tempos da Reforma Protestante, o diálogo teológico abrangia a bibliologia, a eclesiologia e, ainda mais especialmente, a soteriologia. Estudando esses períodos vemos que circunstâncias diversas que rodeavam a igreja impeliram os estudiosos a tratar desses temas, tornando-os centrais em seus sermões e escritos.

Com a escatologia não foi diferente. Nos tempos da Guerra Fria (1945-1991), quando se falava tanto sobre bombas atômicas, quando todos vislumbravam o advento da Terceira Guerra Mundial, com o fim do mundo às portas, quando livros evangélicos americanos diziam que a URSS era o centro do poder do Anticristo, era natural que a escatologia despertasse tanto o interesse dos crentes.

Ocorreu, porém, que a Guerra Fria acabou e muitos livros de escatologia americanos foram para o lixo. Então, ao que parece, a preocupação das pessoas com o futuro iminente desvaneceu. É claro que um novo despertar ocorreu na virada do milênio (o que já era esperado), mas, quando as pessoas perceberam que os anos 2000 não trouxeram nada de realmente dramático, a doutrina das últimas coisas voltou para as prateleiras.

Se existem razões históricas para o desinteresse dos evangélicos pela escatologia, é certo que há também razões kerigmáticas, ou seja, razões ligadas à pregação feita em nossos dias. De fato, no passado, os pastores realçavam em suas mensagens a realidade do céu, a Nova Jerusalém, o dia maravilhoso do encontro com Cristo, quando todo sofrimento teria fim. Ora, isso despertava nos crentes forte interesse pela realidade além. Atualmente, porém, as heréticas pregações sobre prosperidade material deslocaram a esperança do crente do futuro para o presente. Com efeito, pregadores anunciam o fim do sofrimento aqui e agora, fazendo com que as pessoas depositem a esperança em Cristo apenas nesta vida (1Co 15.19), deixando de lado o anelo pelo céu e pela felicidade plena num futuro sem fim (Cl 3.1-4).

Finalmente, o meio evangélico mostra pouco interesse pela escatologia porque as pessoas deixaram de ver nela seu valor prático. As tentativas estéreis de descobrir o significado dos símbolos do Apocalipse ou a identidade da Besta revelaram-se exercícios de especulação que deixaram muitas pessoas enfastiadas, ao realçar uma abordagem escatológica sem nenhum valor vivencial. Ora, a Bíblia é repleta de textos que mostram o quanto a doutrina das últimas coisas é importante para o dia a dia (Rm 6.8,11; 13.11-14; 14.10; 1Co 3.10-15; 4.5; 2Co 5.10; 1Ts 4.13-18; 2Pe 3.10-14; 1Jo 3.2-3). Porém, pregadores sensacionalistas deixaram de lado essa dimensão da escatologia, esvaziando-a de relevância prática e desestimulando, assim, seu estudo.

É preciso, pois, resgatar a importância da doutrina das últimas coisas para o nosso tempo, independentemente das circunstâncias históricas, fazendo frente à pregação mundana de hoje e destacando o aspecto prático do ensino sobre o fim. Os pastores de Deus, portanto, devem voltar a alimentar no coração dos crentes a chama da esperança futura, frisando que o fundamento da nossa conduta e a plenitude da nossa salvação estão além do horizonte que vislumbramos com nossos pobres olhos mortais.

Pr. Marcos Granconato

Soli Deo gloria
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