Quinta, 18 de Abril de 2024
   
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Colossenses 1.1-2 - Saudações Iniciais

 

A introdução da Carta aos Colossenses segue o modelo adotado em outras epístolas paulinas que constam de uma apresentação pessoal, a menção dos destinatários e votos de que esses destinatários recebam bênçãos de Deus.[1] A rigor, esse modelo pode ser visto nas cartas da antiguidade com bastante frequência, porém, o Apóstolo, como era de se esperar, acrescenta elementos cristãos a ele (e.g., o termo “apóstolo” e as expressões “Cristo Jesus” e “santos e fiéis irmãos”). Para Paulo, era importante imprimir marcas distintamente cristãs mesmo sobre os costumes e práticas mais comuns da vida.

No v. 1 o autor se apresenta como “Paulo, apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de Deus”. Deve-se lembrar que a carta é dirigida a uma igreja que não conhece o Apóstolo Paulo pessoalmente (2.1) e que não havia sido fundada por ele (1.7). Por isso, ainda que em Colossos não houvesse qualquer questionamento acerca da sua autoridade apostólica (como já havia acontecido na Galácia e em Corinto), Paulo se preocupa em mencionar o ofício que ocupa, considerando que a igreja estava sendo ameaçada doutrinariamente (2.4,8) e precisava de correção e ensino derivados de alguém que tivesse alto grau de autoridade.

Assim, ao se apresentar como “apóstolo de Cristo Jesus”, Paulo se distingue não só dos pastores comuns da igreja [2], como também dos falsos mestres. De fato, essa é a forma como ele destaca que deve ser ouvido como figura preeminente, um “mestre da verdadeira fé” (1Tm 2.7), detentor de autoridade singular (2Co 13.10), a quem foram revelados os mistérios de Deus (Ef 3.2-9), tendo, por isso, o direito inquestionável de ensinar a igreja. Ele ainda realça que exercia seu ofício “pela vontade de Deus” já que não se autointitulara “apóstolo” como alguns falsos mestres costumavam fazer (2Co 11.13; Ap 2.2).

Ainda que esteja fora de discussão que Paulo seja o autor da carta, o Apóstolo menciona Timóteo como alguém que se une a ele nas admoestações e ensinos que estão prestes a serem expostos. Timóteo é personagem muito conhecido no NT, figurando sem dúvida como o amigo e cooperador mais próximo de Paulo (1Co 4.17; Fl 2.22; 1Tm 1.2, etc.). Nas epistolas que escreveu na sua primeira prisão em Roma (Efésios Filipenses, Colossenses e Filemom), ele só não mencionou Timóteo nas saudações iniciais de Efésios.  

Em 1.1, Paulo chama Timóteo de “irmão”. Isso porque talvez os colossenses o conhecessem e, ao mencioná-lo dessa forma, Paulo queria criar nos seus leitores uma disposição favorável para acolher, com apreço fraternal, o que seria ensinado. Com isso o Apóstolo também mostrava que o que tinha para expor não eram idéias que somente ele nutria, mas o pensamento comum entre crentes fiéis e de boa reputação. De fato, não é medida infrutífera mostrar a quem está em perigo que os alertas que lhe são dirigidos não partem de uma pessoa só, mas é fruto de um consenso do qual participam crentes maduros, dignos de ser ouvidos.

Paulo prossegue dirigindo-se aos crentes de Colossos como “santos e fiéis irmãos em Cristo” (2). Santo é algo separado por Deus para o seu uso. Nos escritos de Paulo, essa palavra nunca é aplicada a indivíduos em particular, mas sempre a igrejas (talvez a única exceção seja Ef 3.5, onde o termo a aplicado a um grupo mais restrito). É possível que isso não ocorra por acaso, mas que Paulo tivesse em mente o fato de que a comunidade dos eleitos é um dos principais instrumentos que Deus usa para a realização de seus propósitos soberanos. Isso coloca a igreja numa posição de notável importância, sendo impossível prescindir dela caso alguém queira participar da obra que o Senhor realiza na história.

Paulo também descreve os colossenses como fiéis, isto é, pessoas dignas de fé. O termo usado também pode ser traduzido como “crente”, ou seja, alguém que tem fé. Os dois sentidos aplicam-se à igreja verdadeira. De fato, o povo de Deus se destaca por nutrir a fé em Cristo. É o povo que crê; a comunidade de crentes. É pela fé que alguém passa a fazer parte do grupo dos salvos e essa mesma fé deve permanecer firme no coração de cada membro desse mesmo grupo. Portanto, é fácil concluir que o povo da fé é também o povo fiel. Ainda que sempre atacados naquilo que creem, Deus os protege e os capacita a perseverar (1Pe 1.3-7; 1Jo 5.4; Jd 24-25).

Assim, mesmo sabendo que os crentes de Colossos estavam sendo assediados por erros grosseiros e mentiras danosas que podiam comprometer a existência da própria igreja, há no coração de Paulo um brilho de confiança. Ele sabe que está se dirigindo aos santos, a assembléia que Deus usa para realizar sua obra no mundo em geral e nas pessoas em particular. Sabe também que a fé que gerou essas pessoas e as colocou entre os salvos é uma fé que se sustenta, fazendo de quem a tem não somente um homem de fé, mas também alguém digno de fé, alguém fiel. Aliás, essa firmeza podia ser vista nos crentes de Colossos (1.4,23; 2.5).

Os colossenses são ainda chamados de irmãos. Mesmo sem conhecê-los pessoalmente, o Apóstolo sabia que, desde a hora em que haviam crido, todos passaram a fazer parte da mesma família, a família de Deus (Ef 2.19). Apontando a existência de laços tão fortes, Paulo quer criar nos colossenses uma disposição favorável ao recebimento das exortações que estão prestes a ser feitas. Dirigindo-se a eles nesses termos, ele destrói barreiras e desencoraja a resistência, despertando nos crentes os afetos naturais, próprios das relações fraternas.

Os crentes são irmãos “em Cristo”. Fora da relação com o Senhor não há como estar unido ao seu povo. Estar em Cristo significa estar revestido de sua justiça e santidade, incluído na sua esfera de graça, soberania e influência especiais. Obviamente, somente os salvos estão em Cristo (2Co 5.17).  Passando a estar nele, o homem se une às demais pessoas que se encontram na mesma condição gloriosa, e se torna parte de uma irmandade que transcende as barreiras das diferenças raciais, culturais, sociais e, o que é importante destacar na igreja moderna, denominacionais (Gl 3.26-28; Cl 3.11).

A igreja para a qual Paulo escreve, além de estar em Cristo, estava também “em Colossos”. Isso mostra que estar “em Cristo” não implica isolamento do mundo. Ainda que tenha sido desarraigada da presente era perversa (Gl 1.4) e transportada do império das trevas para o reino do Filho amado (Cl 1.13), de modo que não pertença mais a este mundo (Jo 15.19; 17.14,16), a igreja de Deus tem o dever de permanecer no mundo (Jo 17.15,18), revelando em ações e pregações que está sujeita a Cristo, tendo-o como Salvador e Mestre (Mt 5.16; Jo 17.23). Estando “em Cristo” e “em Colossos”, a igreja não deve ficar surpresa ao encontrar severa oposição (1Pe 4.12-13; 1Jo 3.13). Antes, deve resistir com firmeza, sem abandonar Cristo nem tampouco “Colossos” (1Pe 5.9-10).[3]

Paulo conclui a saudação inicial com votos de que seus leitores recebam graça e paz. Trata-se de uma forma de oração ou bênção colocada em termos de um bom desejo. Graça é o favor que Deus concede às suas criaturas a despeito de suas falhas e imperfeições. A rigor, consiste da manifestação do amor incondicional do Pai. É pela graça que o crente recebe a salvação (Ef 2.8), as bênçãos materiais (2Co 9.8), a força para enfrentar dificuldades (2Co 12.9), a capacitação para o serviço cristão (Rm 12.6) e o chamado para o ministério (Ef 3.7-8). Os colossenses precisavam da graça de Deus para que vivessem como igreja exemplar, livre, inclusive, das falsas doutrinas que se insinuavam em seu meio (2Co 1.12).

Paz é a ausência de perturbações (1Co 16.11), barreiras (Ef 2.14) e também desordens (1Co 14.33), sendo condição provada pelas pessoas tanto em seu íntimo (Fl 4.7) como em suas relações com os homens (Rm 12.18; 14.19; 2Co 13.11), com  o ambiente ao redor (At 9.31) e com o próprio Deus (Rm 5.1). Paulo quer que os colossenses tenham paz especialmente em seus relacionamentos dentro da igreja, conforme se vê em 3.12-17. Porém, não há dúvida de que também desejava vê-los livres das perturbações que os mestres da mentira e os que se desviam da fé sempre trazem sobre os santos (Gl 5.10; 6.17; Hb 12.15).

Graça e paz, portanto, são expressões que abrangem a totalidade do bem. Elas só podem vir “da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo”.[4] Somente em Deus o crente deve buscar essas coisas, uma vez que somente ele as tem para oferecer (Tg 1.17).

Pr. Marcos Granconato   



[1] Veja-se 1Co 1.1-3; 2Co 1.1-2; Gl 1.1-3; Ef 1.1-2, Fl 1.1-2; 1Ts 1.1; 2 Ts 1.1-2, etc.

[2] Os apóstolos formavam uma classe exclusiva na igreja primitiva. Era um grupo pequeno de homens (provavelmente apenas doze ou, no máximo, dezoito, cf. At 1.26; Rm 16.7; Gl 1.19; Ap 21.14) que viram Cristo ressurreto (1Co 9.1), receberam diretamente dele o apostolado, sem a mediação de pessoas ou igrejas (Gl 1.1. Evidentemente a auto-nomeação também era inaceitável, cf. 2Co 11.13; Ap 2.2), tinham o dever de trabalhar como missionários pioneiros, pregando principalmente em regiões ainda não alcançadas pela mensagem cristã (2Co 10.15-16), recebiam de Deus revelações de notável valor e conteúdo doutrinários (Gl 1.11-12; Ef 3.5) e faziam milagres que comprovavam a autenticidade de seu ofício (2Co 12.12; Hb 2.3-4). A existência desse grupo se restringiu ao século I, quando foram lançados os alicerces doutrinários, éticos e funcionais da igreja (Ef 2.19-21).  

[3] Não é errado o cristão fugir de uma cidade onde haja feroz perseguição (Mt 10.23; 2Co 11.32-33). Porém, nunca é certo o crente evitar a corrupção, os apelos e os ataques comuns do mundo através do isolamento adotado, por exemplo, por alguns personagens ligados ao movimento monástico que surgiu no século IV da era cristã. 

[4] A expressão “e do Senhor Jesus Cristo” não está presente em muitos manuscritos.

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